Patente de remédio pode ter nova regra

carteira de estudante

Laura Ignacio escreve para o “Valor Econômico”:

A controvérsia em torno da necessidade de anuência prévia da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para a concessão de patentes de produtos farmacêuticos – além do registro no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) – pode ter um desfecho em breve.

 

O secretário de tecnologia industrial do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Francelino Grando, anunciou ontem, durante o "XXVII Seminário Nacional da Propriedade Intelectual", realizado em São Paulo, que o governo tem clareza do problema e que a solução deve ser anunciada "a curto prazo".

O secretário disse que os ministérios do Desenvolvimento, Ciência e Tecnologia, Saúde e Casa Civil vão se reunir nos próximos dias para debater o tema e acabar com o imbróglio. "Talvez o Executivo apóie um projeto de lei que determine que a Anvisa deverá apenas identificar eventuais riscos à saúde pública", disse o secretário, que afirmou ainda "não compreender como nosso imposto possa pagar para dois organismos do mesmo Estado fazer, ao mesmo tempo, a mesma avaliação, sobre os mesmos critérios".

Depois que o artigo 229c foi acrescentado à Lei de Propriedade Industrial – a Lei nº 9.279, de 14 de maio de 1996 -, a Anvisa passou a ter a prerrogativa de anuir sobre a possibilidade de patentear produtos farmacêuticos. Com isso, algumas vezes as indústrias têm que lidar com a negativa da Anvisa simultânea à aceitação do INPI sobre a patente de um mesmo produto – o que vem provocando insegurança jurídica entre as empresas do setor e conseqüentemente, o surgimento de litígios na Justiça.

O advogado Wander da Silva Saraiva Rabelo, do escritório Moreau Advogados, tem ações em tramitação na Justiça em nome de indústrias nacionais e multinacionais farmacêuticas que contestam a competência da Anvisa para autorizar a patente de produto farmacêutico. "Essa concorrência de poderes não ocorre em nenhum lugar do mundo", afirma.

Rabelo diz que vem conseguindo decisões da primeira instância da Justiça favoráveis às indústrias, e que, segundo ele, podem inaugurar uma nova jurisprudência a respeito do tema. Isso porque, por enquanto, a Anvisa vem saindo vitoriosa das disputas judiciais.

Como na decisão da Primeira Turma Especializada do Tribunal Regional Federal (TRF) da 2ª Região, que negou um pedido do laboratório Aventis Pharma para obrigar o INPI a registrar a patente do medicamento trihidrato de docetaxel, utilizado no combate ao câncer.

O pedido de registro de patente havia sido aprovado pelo INPI, mas rejeitado pela Anvisa. Na sentença de primeira instância, a juíza federal Edna Carvalho Kleemann declarou que a concessão indevida de patentes pode restringir o acesso da população a medicamentos, decisão confirmada no início de agosto pela desembargadora Liliane do Espírito Santo Roriz de Almeida, do TRF da 2ª Região.

De acordo com o presidente do INPI, Jorge Ávila, quando a Anvisa não concede anuência, o instituto não pode fazer nada. "A legislação não especifica quais critérios devem ser usados pela Anvisa e quais devem ser utilizados pelo INPI em caso de produtos farmacêuticos, mas as empresas estão ajuizando ações na Justiça", afirma.

"E como a Anvisa usa os requisitos de patenteabilidade que o INPI utiliza, há retrabalho", critica o procurador-chefe do INPI, Mauro Maia. O procurador diz ainda que, segundo um parecer da consultoria da União, que faz parte da Advocacia-Geral da União (AGU), a Anvisa deve analisar o pedido de patente somente no que diz respeito ao risco à saúde.

Além da duplicidade de análises de patentes farmacêuticas, o presidente do INPI admite que o estoque de processos registro de patentes ainda não analisados também provoca insegurança jurídica – e diz que o instituto tem investido em algumas ações. Segundo ele, em 2009 o INPI contará com 93 examinadores de patentes a mais para dar conta dos pedidos de registro. "E vamos pedir a criação de mais 165 vagas para 2010", diz.

A meta do instituto, de acordo com Ávila, é a de que até outubro de 2011 o órgão conclua a análise dos depósitos de patentes realizados até 2004 e passe a julgar os pedidos de patentes feitos até 2010 em até quatro anos, a contar da data do depósito.

Outras duas metas do instituto, de acordo com Ávila, são a criação de uma nova legislação ou a alteração da lei já existente para que o INPI possa registrar patentes sonoras, olfativas, táteis, o chamado "trade dress" – conjunto-imagem de determinado produto ou serviço – e domínios, além de permitir a proteção da inovação incremental como de polimorfos, segundos usos, cristais e co-cristais.

"Má regulação também leva à insegurança jurídica. E os reflexos dessa insegurança são sentidos nos caixas das empresas", afirma Ávila.

(Valor Econômico, 26/8)