Corte de bolsas: mais um mandado de segurança bem-sucedido

carteira de estudante

 Mais um pós-graduando teve o seu direito à bolsa garantido após o cancelamento do benefício de centenas de pós-graduandos brasileiros por ocasião da imprecisão da Capes e do CNPq na aplicação da Portaria Conjunta nº 01 de 2010, que possibilita o acúmulo da bolsa de pós-graduação com vínculo empregatício.

Para saber mais sobre o corte de bolsas, acesse:

CAPES e CNPq anunciam ANULAÇÃO do ofício circular que cancelava bolsas

Na UFRGS e na UFJF já haviam sido relatados casos de vitória do pós-graduando que decidiu reagir com medida judicial contra o corte de bolsas. Agora foi a vez do professor Mário Martins, estudante da UFSC. Confira a mensagem enviada por ele à lista de e-mails de bolsistas (para participar desta lista, envie um e-mail para [email protected]):

"Oi gente!



Postei há algum tempo aqui externando meu problema. Tive minha bolsa de doutorado cortada pela UFSC por estar trabalhando como prof. substituto na UFC. Entrei com ação contra a Pró-Reitoria, a Coordenção, a Capes e a UFSC. Pois bem, depois de quase 45 dias o MPF e o Juiz se pronunciaram a meu favor. O argumento foi que o PPG de História/UFSC procedeu às escuras sem me apresentar direito de defesa. O Juiz mandou reativar o pagamento da bolsa. Abaixo segue a sentença do Juiz.



Obrigado a tod@s pelo apoio! 

Saudações

Mário Martins"

Para servir de subsídios a possíveis novos processos, reproduzimos o texto do Mandado de Segurança (grifo nosso):



MANDADO DE SEGURANÇA Nº 5012943-60.2011.404.7200/SC

IMPETRANTE: MARIO MARTINS VIANA JUNIOR

ADVOGADO: Marília Abreu Duarte

IMPETRADO: Coordenadora da Pós-Graduação em História –

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA – UFSC – Florianópolis

Pró-Reitora de Pós Graduação – UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA – UFSC – Florianópolis

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA – UFSC

MPF : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

SENTENÇA

I – Relatório

Trata-se de ação na qual o impetrante pede a concessão da segurança para que as autoridades impetradas lhe: (a) restabeleçam o pagamento da sua bolsa de estudos referente ao curso de Doutorado em História na UFSC; e (b) paguem os valores atrasados desde a data do cancelamento da bolsa de estudos (julho/2011).

O impetrante alega que:

– é doutorando em História pela UFSC;

– em julho/2009 foi contemplado com uma bolsa de Doutorado da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), no valor de R$ 1.800,00;

– é Professor Substituto da Universidade Federal do Ceará (UFC), função que exerce desde 6/10/2009;

– em julho/2011 teve sua bolsa de estudos cancelada, sem quaisquer procedimentos prévios que lhe assegurassem o exercício do contraditório e da ampla defesa; e

– tomou ciência de que o motivo para o cancelamento foi o vínculo de professor substituto que mantém com a Universidade Federal do Ceará.

O impetrante instruiu a ação com procuração e documentos. Requereu a concessão da gratuidade da justiça (evento 1). O MM. Juiz Federal que me substituiu no feito indeferiu a ordem

liminar e deferiu a gratuidade da justiça (evento 2).



O impetrante efetuou pedido de reconsideração (evento 9) e a MMª. Juíza Federal que me substituiu no feito o indeferiu (evento 12). A UFSC requereu seu ingresso no feito (evento 21).

Notificadas, as autoridades impetradas prestaram informações (evento 26). Requereram a denegação da segurança. O Ministério Público Federal (MPF) manifestou-se pela concessão

da segurança (evento 29).

II – Fundamentação

A questão controvertida pendente a decidir refere-se à legalidade do cancelamento da bolsa de estudos concedida ao impetrante. Passo a examiná-la.

A despeito da legalidade ou não do cancelamento da bolsa de estudos do impetrante, o ‘procedimento’ adotado pela UFSC possui vício insanável, que conduz à anulação do ato administrativo praticado.

Explico.

É sabido que a administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos, a teor da súmula nº. 473 do Supremo Tribunal Federal (STF) e do art. 53 da Lei nº. 9.784/99. Contudo, tal poder/dever não significa que a Administração possa assim proceder sem a observância dos direitos dos administrados e é

exatamente nesse ponto que reside o vício do ato administrativo praticado pela

UFSC.

Resta claro nos autos que o cancelamento da bolsa de estudos do impetrante foi efetuado sem que a este fosse deferido o seu inafastável direito de defesa. Vale dizer: não foi possibilitada ao impetrante prévia manifestação acerca do ato administrativo contestado nesta ação, pois este só tomou conhecimento do cancelamento de sua bolsa de estudos quando percebeu que o pagamento não havia sido realizado na data prevista.

Portanto, a UFSC descumpriu a regra prevista no art. 5º, LV, da CF/88, que assegura aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes. Outrossim, o contraditório e a ampla defesa são princípios expressos no art. 2º da Lei nº. 9.784/99.

Nesse sentido, já decidiu o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) em caso idêntico, a saber:



ADMINISTRATIVO. ENSINO SUPERIOR. PROUNI. CANCELAMENTO DA BOLSA. IMPOSSIBILIDADE. PRINCÍPIOS DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA.



A Constituição Federal garante a todos os litigantes, em processos judiciais e administrativos,

o direito ao exercício do contraditório e da ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes (art. 5º, LV)
. No caso, o processo que culminou com o cancelamento da bolsa do impetrante transcorreu sem sua participação ou sequer conhecimento de sua instauração, em desrespeito flagrante aos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório. (TRF4, APELREEX 0030139-11.2009.404.7100, Quarta Turma, Relatora Marga Inge Barth

Tessler, D.E. 30/07/2010)

Por fim, cumpre ressaltar que, apesar de reconhecida a ilegalidade praticada pela UFSC, o pedido do impetrante acerca dos pagamentos em atraso não pode ser acolhido na extensão efetuada (desde a data do cancelamento – julho/2011), pois o mandado de segurança não possui efeitos

financeiros pretéritos – art. 14, § 4º, Lei nº. 12.016/2009. Vale dizer: somente será garantido

ao impetrante o direito de receber os valores não pagos desde a data do ajuizamento da ação (19/9/2011).

Embargos declaratórios (art. 535, Código de Processo Civil – CPC). Depois de sentenciada é reduzidíssima a atuação do juiz da causa (art. 461, I e II, CPC). Cada recurso tem sua adequação e esse cabe apenas para obter integração válida de decisão obscura, contraditória ou omissa. É

dizer: trata-se de exceção à hipótese de encerramento da jurisdição e, como tal, exige interpretação literal. Por isso, causa repulsa o seu uso indevido e, mais ainda, para fim

protelatório, em prejuízo da Administração da Justiça, o que não tem sido incomum. Anoto ainda, que: a) mesmo quando utilizado para fins infringentes sua admissão é restrita a casos de nulidade manifesta do julgado (RTJ 89/548, 94/1.167, 103/1.210, 114/351); e b) para arguir erro material é

descabido, pois basta uma simples petição. Daí este registro, para advertir sobre a possibilidade

de imposição da multa legal (arts. 14 a 17, CPC), com amparo na jurisprudência, v.g.: STF, EDcl no AgR no AI 460253 AgR-ED, 2ª T., Rel. Min. Ellen Gracie, D.Je 18.2.2010; STJ, EDcl nos EDcl no AgRg nos EREsp 838061, S1, Rel. Min. Humberto Martins, D.Je 6.11.09; e TRF4, AC 2004.71.00.034361-2, 3ª T., Rel. Juíza Federal Marina Vasques Duarte de Barros Falcão, D.E. 27.1.2010. 

III – Dispositivo

Ante o exposto, CONCEDO PARCIALMENTE a segurança e julgo o processo com resolução do mérito – art. 269, I, CPC. Por conseguinte:

a) DETERMINO às autoridades impetradas que restabeleçam ao impetrante os pagamentos referentes à bolsa de estudos no curso de Doutorado em História, no prazo máximo de 20 dias contados do recebimento da intimação desta sentença, e o mantenha até o cumprimento do devido processo legal; e

b) CONDENO a UFSC a pagar ao impetrante os valores em atraso referentes à bolsa de estudos, desde a data do ajuizamento da ação (19/9/2011) até a data da efetiva reimplantação, ficando os valores para serem apurados por cálculos no processo de execução (arts. 730/1, CPC), com atualização e juros pelos critérios da caderneta de poupança. Sem honorários advocatícios – art. 25, Lei nº. 12.016/2009. Custas isentas – art. 4º, I, Lei nº. 9.289/96.

Defiro o ingresso da UFSC no feito – art. 7º, II, Lei nº. 12.016/2009.

Intime-se-lhe desta sentença, bem como dos posteriores atos processuais a serem praticados.

Sentença sujeita ao duplo grau de jurisdição – art. 14, § 1º, Lei nº. 12.016/2009. Caso seja interposta apelação (tempestiva), recebo-a somente no efeito devolutivo – art. 14, § 3º, Lei nº. 12.016/2009. Neste caso, deverá a Secretaria da Vara intimar a parte adversa para contrarrazoá-la, no prazo legal, e, após, remeter os autos ao TRF4. 

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Florianópolis, 28 de outubro de 2011.

Hildo Nicolau Peron

Juiz Federal Substituto

Documento eletrônico assinado por Hildo Nicolau Peron, Juiz Federal Substituto, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.jfsc.jus.br/gedpro/verifica/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 4009567v4 e, se solicitado, do código CRCF3917290. Informações adicionais da assinatura: Signatário (a): Hildo Nicolau Peron Data e Hora: 28/10/2011 19:45.

 

Da redação, com informações de Mário Martins.