ANPG na mídia: Governo pede devolução de R$ 30 milhões concedidos a bolsistas

carteira de estudante
Em matéria do G1, a presidente da ANPG, Elisangela Lizardo, debate a questão da fuga de cérebros do Brasil e pauta a valorização das bolsas de pesquisa.
 
O Tribunal de Contas da União (TCU) analisa processos que pedem a devolução de pelo menos R$ 30 milhões concedidos por órgãos do governo federal em forma de bolsas de estudo de pós-graduação no Brasil e no exterior.
 
Os valores consideram os 115 processos encaminhados pela Controladoria-Geral da União (CGU) ao tribunal em 2010, que envolvem casos de prestação de contas irregular, pessoas que receberam os valores mas não concluíram os cursos e bolsistas que foram para o exterior e não retornaram ao Brasil.
 
São bolsas de estudos concedidas pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), ligado ao Ministério da Ciência e Tecnologia, e pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), ligada ao Ministério da Educação.
No fim de julho, o governo anunciou uma parceria entre Capes e CNPq, o programa Ciência Sem Fronteiras, que prevê 100 mil bolsas de intercâmbio nas principais universidades do exterior para estudantes do nível médio ao pós-doutorado (veja no vídeo acima).
 
A CGU apontou irregularidades no relatório de 2010 das tomadas de contas especiais, que são processos instaurados pelos órgãos do governo federal quando os danos ao erário superam R$ 23 mil.
 
Conforme a Controladoria, os processos foram repassados para julgamento do TCU. Somente no ano passado, foram 108 processos relativos ao CNPq, que somam R$ 29,5 milhões, e sete da Capes, no valor total de R$ 1,3 milhão, totalizando 115 constatações de supostas fraudes.
 
Esses casos se referem a bolsas concedidas entre 1999 e 2009, mas os processos foram instaurados somente no ano passado. Os processos pedem a devolução de, em média, R$ 260 mil — há casos de valores que chegam a R$ 500 mil. A maioria dos casos ainda não foi analisada pelo TCU.
Em consulta ao site do tribunal, o G1 localizou cerca de 70 decisões relativas a bolsas da Capes e do CNPq. São processos encaminhados desde 2003 ao TCU, nos quais foram publicados acórdãos que determinam a devolução de quantias.
 
CNPq
 
O vice-presidente e diretor de Cooperação Institucional do CNPq, Manoel Barral Neto, diz que são poucos os casos de fraude envolvendo bolsistas, em comparação com o universo total de bolsas concedidas. Em relação a bolsas no exterior, segundo ele, foram concedidas 3,2 mil bolsas e 16 casos de estudantes que foram, não voltaram e não ressarciram os cofres públicos.
 
"Quando abre processo, muitos resolvem a situação. A gente tenta negociação mais amigável. Não havendo acordo, a gente manda para o TCU. Quando sentem que ficou sério, negociam. Em grande parte dos casos, há acordo no TCU", diz Barral Neto.
 
Conforme o vice-presidente do CNPq, todos os bolsistas que saem do país para estudar assinam termo de compromisso que os obriga a permanecer no Brasil após o curso pelo mesmo tempo em que ficaram no exterior,. Caso contrário, têm de devolver os recursos. Eles mandam um relatório anual sobre o curso e também precisam apresentar certificado de conclusão.
 
Para Barral Neto, o aumento de bolsas para o exterior previsto não preocupa o governo. Para ele, não haverá incremento nas irregularidades relativas às bolsas.
 
"O processo, atualmente, de prestação de contas já é rigoroso. A gente detecta todos esses casos e vamos manter o mesmo sistema de controle. Nos relatórios analisados, não há nenhuma evidência de que precisemos tornar a coisa mais rígida."
 
Pós-graduandos
 
Na avaliação de Elisangela Lizardo, presidente da Associação Nacional de Pós-Graduandos, os casos de "fuga de cérebros", quando os profissionais não retornam ao Brasil, são poucos.
 
"O governo tem por política cobrar de volta dos que não voltam, e a gente acha que é importante uma negociação, solução que não prejudique, mas a gente respeita essa decisão de cobrar uma responsabilidade com o recurso público da população. Mas é um número pequeno. A evasão não é significativa e tem sido cada vez menor."
 
Ela diz que a maioria dos casos é de alunos que obtêm melhores oportunidades de trabalho durante o curso e acabam ficam no exterior. Mas há ainda, segundo ela, situações em que o estudante precisa deixar o curso e também fica em situação irregular, uma vez que a apresentação da certidão de conclusão é obrigatória.
 
Elisangela Lizardo afirma que o aumento das bolsas vai ajudar a comunidade científica, mas ainda é preciso mais políticas, principalmente voltadas para a pesquisa dentro do Brasil.
 
"Falta política de valorização das bolsas", diz. Segundo ela, atualmente um aluno de mestrado ganha cerca de R$ 1,2 mil como bolsa, o que ela considera "pouco" para um profissional formado que ganharia muito mais no mercado.
 
Engenheira fez acordo
 
A engenheira Maria Angélica Fonseca Krause é uma das ex-bolsistas que responderam a processo no TCU.
 
No ano passado, fez acordo com o tribunal para o pagamento de R$ 100,6 mil em 96 parcelas após o tribunal afirmar que ela cometeu irregularidade por ter ido estudar na Alemanha e não ter retornado ao Brasil.
 
Ela obteve bolsa do CNPq em 1991 para um doutorado em ciências naturais na Technische Universität Braunschweig, na Alemanha. O processo começou em 2009.
 
A defesa da engenheira afirmou ao G1 que argumentou que não houve má fé por parte da pesquisadora uma vez que o órgão em que ela trabalhava antes de ir para a Alemanha, um instituto de pesquisa em Joinville (SC), fechou.
 
Maria Angélica Fonseca Krause diz se sentir “imensamente injustiçada” com a decisão do TCU e do CNPq. “A bolsa que recebi foi concedida ao Centro de Desenvolvimento Biotecnológico de Joinvile, onde eu trabalhava. Essa bolsa foi transferida para mim em troca do meu salário. Eu tive que assinar as condições impostas. Isso significa que os 4 anos que fiquei na Alemanha eu apenas recebia a bolsa, apesar de estar empregada. Quando eu deveria retornar, o centro foi fechado e eu não tinha onde trabalhar”, disse a engenheira.
 
Ela afirmou também que o CNPq jamais entrou em contado no endereço alemão para dizer que Maria Angélica deveria voltar ao Brasil. “Aparentemente eles enviavam cartas para um endereco em Joinville, para alguém que não conheco e que não dei jamais o endereco.”
 
Maria Angélica diz que, após dez anos, recebeu correspondência do TCU e foi conversar. “Confesso que me arrependo, pois estou sendo imensamente prejudicada. Tendo que pagar por uma bolsa, com juros, que foi concedida à uma Instituicao, para que a mesma pudesse economizar o meu salario. Estou pagando por ter trabalhado por quatro anos.”
 
No acórdão, o TCU admite que não houve má fé. Mesmo assim, determinou a devolução da quantia. Atualmente, a engenheira mora na Itália e trabalha na área de energia solar.
 
Fonte: G1