Cenário de terra arrasada na ciência brasileira

Nestes dias 8 e 9 de maio, representações das mais diversas entidades científicas e acadêmicas nacionais estiveram reunidas no Congresso Nacional e no Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) como parte das mobilizações do Movimento “Ciência Ocupa Brasília”, coordenado pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Foram realizadas audiência pública, reunião com representantes de entidades científicas e MCTIC e o lançamento da Iniciativa para a Ciência e Tecnologia no Parlamento (ICTP.br).

A audiência pública com o ministro de Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações, Marcos Pontes, contou com ampla representatividade de parlamentares, assessores e entidades científicas, que chegaram a ficar barradas sob a justificativa de superlotação do plenário. A iniciativa significou um gesto de abertura à escuta dos principais dilemas que afetam a comunidade científica nacional.

O ministro não escondeu o cenário de caos do MCTIC com um bloqueio da ordem de 42,27% em seu orçamento, situação que reflete diretamente o rebaixado financiamento a que está submetida a ciência brasileira. Deixou bem claro que o orçamento destinado ao CNPq só está garantido até setembro deste ano, depois do que não se sabe o que será feito.

Não bastasse isso, o Ministério da Educação, sob a gestão de Abraham Weintraub, em um gesto estapafúrdio, delibera o corte de 30% do orçamento das universidades e institutos federais. Na prática, os cortes impostos às universidades e IFs inviabilizarão o funcionamento das instituições por impactarem diretamente em despesas ordinárias, que afetam a estrutura básica de manutenção necessária ao acolhimento de estudantes, professores, técnicos e toda a comunidade acadêmica.

Ora, bem sabemos que 95% da produção científica nacional é feita dentro das universidades públicas, com investimento público, muito especialmente no âmbito da pós-graduação, e conta com o protagonismo importante de pós-graduandos e pós-graduandas. Sem garantias de recursos para as universidades, a ciência brasileira está fortemente ameaçada.

O diálogo entre Ministério da Educação e Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações parece inexistir. A discrepância entre os discursos dos ministros parece um abismo que dificilmente produzirá propostas convergentes e necessárias para a saída da crise em estamos mergulhados. O Ministério da Economia parece não ter clareza sobre o papel estratégico que pode exercer a ciência para o desenvolvimento nacional, sobretudo em tempos de crise.

Completando o cenário, fomos surpreendidos com a notícia de suspensão das bolsas Capes, um fato que só atesta o desprezo do governo Bolsonaro pela ciência brasileira e o desrespeito deste governo com os jovens pesquisadores cientistas. Colocamos a posição da ANPG em relação a este cenário: se os cortes e suspensão de bolsas se mantiverem, veremos no Brasil um cenário de terra arrasada na ciência. Isso porque, confirmada a manutenção do congelamento das bolsas, não haverá recursos para que os pós-graduandos subsidiem suas pesquisas e deem conta de sua sobrevivência material. Veremos um cenário de esvaziamento das pós-graduações, pois nossos jovens deixarão de ver a ciência como um caminho com perspectiva de atuação e, finalmente, em consequência disso, assistiremos a uma redução drástica na produção científica nacional.

A ANPG segue buscando o diálogo e linhas de atuação conjunta com os mais diversos atores, entidades científicas, movimentos sociais e toda a sociedade civil para que possamos defender a ciência e a educação nesse contexto generalizado de desmonte e desconstrução. Nessa perspectiva de atuação, lançamos no Congresso Nacional, no bojo do Movimento “Ciência Ocupa Brasília”, a Iniciativa para a Ciência e Tecnologia no Parlamento (ICTP.br), que discutirá junto a parlamentares, entidades científicas e movimentos sociais saídas para esse cenário devastador. Uma delas, se aprovada, pode nos garantir um desafogo temporário para tempos de crise. Trata-se do PL 5876/2016, de autoria do deputado Celso Pansera, que prevê a destinação de 25% do Fundo Social do Pré-sal para a área de ciência e tecnologia.

A ciência brasileira grita por socorro, a universidade grita por socorro!

Todas e todos temos o dever de ir às ruas neste dia 15 de maio rumo à Greve Nacional da Educação. Que sintam do que o povo organizado é capaz!

Manuelle Matias é vice-presidenta da ANPG