Carta aberta aos professores presos com o Reitor Cancellier no dia 14/9/2017

carteira de estudante

 

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Luiz Carlos Cancellier de Olivo

O reitor Cancellier foi preso pela Polícia Federal, na Operação Ouvidos Moucos, em setembro de 2017, e estava sendo investigado, sem saber, pela delegada Érika Mialik Marena.
Cancellier, que não tinha antecedente criminal algum, era suspeito de uma suposta tentativa de obstruir uma investigação sobre desvios no programa de educação a distância. A denúncia foi feita, principalmente, por um desafeto do reitor, o corregedor-geral da UFSC, Rodolfo Hickel do Prado, integrante da Advocacia-Geral da União em Santa Catarina.
Hoje completa um ano de sua prisão irresponsável e a ANPG saúda a memória de Cancellier.
O irmão do reitor, Acioli Cancellier de Olivo, escreveu uma emocionante carta aberta sobre este fatídico dia. Leia:
Meus caros professores,
Há exatamente um ano atrás eu nunca havia ouvido falar de seus nomes. Naquela manhã fui acordado com um telefonema de uma amigo que me perguntava: Você é parente do reitor da UFSC ? Ao responder que eu era irmão, disse-me que ele acabara de ser preso.
Naquela manhã, quando a Polícia Federal invadiu as sua residência e a do Cau, a violência da ação mudou drasticamente a vida de vocês e de suas famílias; foi o ato inicial de uma tragédia que nos levou o Cau, abalou profundamente nossa família, seus familiares, os amigos em comum, a UFSC e por que não dizer, o país inteiro que não se submete à ditadura dos tanques e togas, citando um jornalista.
Daquela data em diante, seus nomes começaram a me soar familiares e mesmo sem conhece-los, uma empatia imensa me ligou a cada um de vocês; o sofrimento de cada um de seus familiares me fazia sofrer, pois refletia o sofrimento de cada uma dos meus.
Cau se foi, seu gesto nos doeu muito, mas, em seguida, atentamos que o fez não por sua imagem enlameada, mas para mostrar a cada um de seus carrascos, que não se pode tirar o que de mais importante um homem digno possa ter: a honra. E passamos a nos orgulhar daquele gesto corajoso e heroico. Se no dia 14 de setembro de 2017, arrancaram da cama um homem digno, o cadáver que nos devolveram 18 dias após, não o reconhecemos. Não por seus ossos estraçalhados; não por sua carne dilacerada; não por sua face desfigurada. Não o reconhecemos porque aquele cadáver não tinha a mínima semelhança da pessoa que o Cau fora em vida: honrado, humanista, generoso e solidário.
Um ano se passou e, em todos esses dias, minha luta tem sido em uma única direção: resgatar a honra de meu irmão. Buscar que o Estado reconheça que seus agentes erraram. Erraram em caluniá-lo; erraram em humilhá-lo; erraram em castrá-lo, apartando daquilo que ele mais se orgulhava, servir a UFSC.
Meus caros amigos, se assim posso chamá-los, pois um sentimento de amizade e fraternidade nos uniu pela tragédia. Meus irmãos: vocês foram também vítimas da mesma injustiça; injustiça que não os levou deste mundo, mas que certamente causou perdas e danos irreparáveis. Que lhes irá devolver as angústias, sofrimentos e dores que cada um de vocês passou nestes últimos anos? Quem devolverá a cada um de seus entes queridos a alegria de viver, o brilho nos olhos e o sorriso que minguaram nestes 365 dias? Quem irá garantir que a sua tão esperada reintegração a UFSC ocorra sem traumas? Quem poderá dizer que vocês poderão ensinar, orientar e frequentar o meio acadêmico com a segurança de homens honestos e dignos, sem a certeza de um dedo acusador na figura de um aluno ou de seus próprios pares?
Em ocasião recente fiz uma analogia, que reitero: O Cau morreu, vocês sobreviveram. Mas esta sobrevida, sem a reparação integral da honra e dignidade feridas, equivale a uma morte em vida. Tramita no Congresso Nacional projeto de Lei que pune o abuso de autoridade, cujo relator no Senado, Roberto Requião, a denominou de Lei Cancellier. Mas não podemos esperar. A cada dia que passa, sem a devida reparação da honra de cada um de vocês, um pouco de cada um morre.
Então, meus queridos amigos e irmãos, nesta data simbólica, uno meus pensamentos aos seus; nosso familiares são solidários aos seus familiares. E me comprometo, a cada dia, com mais intensidade, envidar esforços na luta pela rediginficação do Cau e de todos vocês. Lutar pela recuperação da honra maculada de cada um é lutar pela garantia que nenhum ser humano seja julgado, condenado e executado sumariamente como vocês todos foram. E conclamo aos que não se conformam com o arbítrio, a se juntarem nesta escalada, pois citando o mesmo jornalista, “nas ditaduras, não há lugar para míopes inocentes.”
Um fraterno abraço
Acioli Cancellier de Olivo