Debate mostra que o financiamento da ciência e da educação voltou a patamares de 2010

A primeira mesa de debates do 27º Congresso da ANPG abordou o tema “Crise econômica e impactos no financiamento da educação e da pesquisa”, tendo como expositores o ex-ministro de C&T e secretário-executivo da Iniciativa para a Ciência e Tecnologia no Parlamento, Celso Pansera; a professora Soraya Smailli, reitora da Universidade Federal de São Paulo e diretora da Andifes; Milton Pinheiro, cientista político e professor da Universidade do Estado da Bahia, com a mediação de Gissela Garcia, estudante de doutorado da UFMG.

Celso Pansera iniciou a exposição mostrando um gráfico sobre os totais de investimentos do governo central desde 2014 até a projeção para 2021. A análise mostra que houve um pico de investimentos de R$ 75 bilhões de reais em 2014 e, desde então, há uma queda contínua que projeta cerca de R$ 25 bilhões para o próximo ano – ou seja, 1/3 do executado 8 anos atrás. Tratando apenas do orçamento discricionário do Ministério da Educação (MEC), o tombo foi de R$ 42 bilhões para R$ 18 bilhões no mesmo período de comparação.

Segundo o ex-ministro, o quadro ainda pode ser mais grave, uma vez que parte da verba depende de aprovação pelo parlamento da “regra de outro”. “Esse é um problema que vamos debater. Dois terços do orçamento debatido para o ano que vem está contido na regra de ouro, que se os deputados não aprovarem, o governo só estará autorizado a gastar um terço disso”. “No processo histórico, estamos voltando ao ano de 2010”, apontou Pansera.

O aperto orçamentário promete comprometer o financiamento de bolsas de estudos. “Em 2019, o CNPq fechou a conta porque nós fomos para cima do Congresso. Para 2020, ao longo do debate no Congresso, conseguimos melhorar um pouquinho a previsão. Mas em 2021, os recursos discricionários, na previsão, já são insuficientes para o pagamento das bolsas”, afirma. Quando se trata do orçamento do Ministério de Ciência e Tecnologia, órgão ao qual está vinculado o CNPq, a situação é drástica, registrando um decréscimo de três vezes, passando de 8,7 bilhões em 2014 para apenas 2,7 bilhões em 2021.

Soraya Smaili reafirmou o papel das universidades públicas e os institutos federais cumprem um papel central para o país, pois respondem por 90% da pesquisa realizada. Para ela, o ano de 2021 se iniciará em condições “catastróficas” para as universidades em virtude dos cortes de 16,5% no orçamento para as instituições federais de ensino superior. “Além do corte, quase 60% do orçamento está condicionado ao resultado primário, ou seja, vai depender de aprovação dos deputados ano que vem. Se isso se confirmar, o ano será iniciado em condição catastrófica, porque não teremos recursos para o enfrentamento da Covid e teremos uma situação de muita preocupação durante todo 2021”.

A professora ainda revelou que o orçamento do Ministério da Saúde sofrerá cortes de 35 bilhões em meio à pandemia. “O impacto da Emenda Constitucional 95 não é só na ciência e na educação superior, mas também no SUS. Há uma redução dramática dos percentuais aplicados no SUS, chegando a 13,5% em 2019”, afirmou.

A reitora apontou como caminhos para a recomposição das verbas a liberação do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT), a flexibilização do teto de gastos e a retirada dos recursos próprios da universidade do cálculo do teto.

O cientista político Milton Pinheiro que o mundo vive uma crise sistêmica do capital, que muda o mundo do trabalho, o perfil do capitalismo e uma reconfiguração do Estado. Para ele, os recursos públicos têm sido apropriados para a revalorização do capital via pagamentos da dívida pública e não para suas destinações originais. “Precisamos mais do que nunca da organização da classe trabalhadora. Essa articulação tem que ser pensada para além da democracia formal”, disse.