Ciência sem Fronteiras ajuda a internacionalizar educação brasileira, dizem pesquisadores

carteira de estudante

Apesar dos problemas iniciais, o Ciência Sem Fronteiras é uma iniciativa importante para a internacionalização da educação brasileira, disseram nesta terça-feira (22) pesquisadores convidados para audiência pública sobre o tema promovida pela Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática (CCT). Eles observaram que o programa contribui para o fim do isolamento científico do país e precisa passar por avaliações e medições de custo-benefício. Os resultados, porém, só poderão ser percebidos em médio e longo prazos.

De acordo o diretor de Relações Internacionais da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), Adalberto Val, o Brasil não produz tecnologia porque as matrículas nas engenharias não passam de 4%. A ideia básica do programa é aumentar essa oferta, mas colher os frutos desse investimento requer tempo, observou.

O Ciência sem Fronteiras tem apenas quatro anos, e a formação de um engenheiro razoável leva cinco, e mais cinco para que ele se torne bom, acrescentou ainda. Por isso, avaliar o programa como malsucedido nesse momento não é razoável, muito menos abortá-lo no nascedouro. Mas a “função social” do programa deve ser averiguada, defendeu o diretor da Capes.

Entretanto, revelou Adalberto ao responder uma pergunta de internauta, por meio do e-Cidadania, não estão previstos novos editais de concessão de bolsas no ano que vem. Em tempos de ajuste fiscal, o programa sofreu um corte de 35% no orçamento, e os recursos mantidos serão utilizados para a conclusão dos cursos dos alunos que já estão no exterior, até 2018. Para ele, seria trágico promover o encerramento abrupto dos estudos, afetando até mesmo a credibilidade das instituições brasileiras.

— Estamos no meio do processo, deixar estagnar é perder o investimento feito até aqui — avaliou ainda.

Resultados

O coordenador-geral do Programa Ciência sem Fronteiras no Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Geraldo Nunes, também defendeu o programa. Ele lembrou que, nas décadas de 1960 e 1970, o governo investiu na formação de doutores no exterior nas áreas de exploração de petróleo, pesquisa agrícola e design de aeronaves, e hoje o Brasil é um líder mundial nos três campos. O investimento em pesquisadores trará resultados, salientou.

O presidente do Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE), Mariano Laplane, afirmou que o Brasil não gasta pouco com pesquisa e desenvolvimento, está entre os dez países que mais direcionam recursos, mas atrás dos integrantes do G7 e de China, Coreia do Sul, Índia e Rússia, com cerca de US$ 33 bilhões em 2014. Os Estados Unidos investiram US$ 465 bilhões, a China, US$ 284 bilhões e a Rússia US$ 40 bilhões no mesmo período. Ele defendeu o estímulo às áreas de engenharia e ciência, para que se tornem vocações do país.

— Manter vocações e construir novas não é um desafio pequeno, é caro. Precisamos gastar muito, e precisamos gastar bem — opinou.

Laplane observou que esses países direcionam a maioria dos recursos para as áreas em que se sobressaem, mas porque souberam construir empresas que se tornaram líderes. Metade do que a Coreia gasta é na indústria de televisores, e hoje domina o setor mundialmente, exemplificou.

O senador Omar Aziz (PSD-AM), relator da avaliação do Ciência Sem Fronteiras como política pública da CCT, disse que essa é uma imensa lacuna brasileira: descobrir sua vocação. Assim como a da Coreia o fez, além dos Estados Unidos, que dominam as áreas de telefonia e informática, e da Alemanha com os automóveis. Ele sugeriu que o Brasil invista em biotecnologia, ao lembrar da Amazônia, uma reserva imensa de matéria-prima.

— Nossa vocação é samba, é produzir jogador de futebol? O Brasil precisa definir uma vocação para que a gente possa focar naquela área, caso contrário vamos patinar — avaliou.

Ele tem se mostrado bastante crítico do Ciência sem Fronteiras que, a seu ver, custa muito e é mais bem aproveitado pelos indivíduos beneficiados, não pela sociedade. Os R$ 9,5 bilhões gastos até agora não trouxeram nenhum retorno para o país, disse. O senador defendeu o investimento desses recursos na própria educação brasileira, já que há universidades federais correndo o risco de serem fechadas por falta de laboratório, por exemplo.

Avaliação

Fernanda Sobral, da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), apesar de ser uma entusiasta do Ciência sem Fronteiras, defendeu uma ampla avaliação para aperfeiçoamento do programa, com ênfase nos impactos socioeconômicos, além de científicos.

— Acho que o programa está atendendo aos objetivos de ampliação de estudo para inovação no exterior. Mas precisa saber até que pondo essa ampliação trouxe impactos para aumento da inovação no país. Isso só se vai saber a partir de uma avaliação — disse.

Ela comemorou pontos positivos do programa, como a ampliação do acesso a estudos no exterior em áreas estratégicas para a inovação e o fato de ficar patente para a sociedade brasileira a importância do aprendizado de uma língua estrangeira, além da valorização da graduação brasileira. Universidades estrangeiras estão procurando alunos brasileiros porque “sabem que eles são bons”.

Fernanda também apontou alguns gargalos, como a falta de planejamento e informação entre as agências de fomento e universidades, as dificuldades de aproveitamento de disciplinas depois que os estudantes voltam, e de obtenção de vistos para pesquisadores estrangeiros.

O presidente da CCT, senador Cristovam Buarque (PDT-DF), concordou com a relevância do programa, apesar das falhas, da maneira apressada como foi posto em prática e da falta de avaliações para medir sua eficácia e seus benefícios.

— É um grande programa, foi uma grande iniciativa, mas precisa de ajustes. Se formos fazer uma análise de custo-benefício, é muito provável que, comparado com outros investimentos, os resultados do programa não sejam os melhores. Mesmo assim é um programa que traz vantagens para o Brasil.

Cristovam defendeu ainda o investimento na educação de base, pois ali, a seu ver, é que estão os cientistas e engenheiros do futuro.

Fonte: Agência Senado