Diretoria de Ciências Humanas e Sociais no CNPq: Questões para a sua criação

Por Hercília Melo*

O que vemos na realidade da pesquisa em ciências humanas e sociais é que o conjunto das áreas deve seguir critérios das ciências exatas e da natureza e absorver seus métodos. Será que as tendências (políticas, religiosas, entre outras) desejam o pensamento autônomo das ciências humanas e sociais e reconhecem seus produtos (que são múltiplos e não dialogam com concepções vigentes de resultados científicos)? Diversas formas de fazer ciência já foram impostas (e ainda têm adeptos nos dias atuais) para promover ordem social e “limpar” ações nocivas dos pesquisadores, para possibilitar melhores hábitos intelectuais (a física social, a avaliação situacional, etc.) e alcance universal.

A proposta da criação da diretoria de ciências humanas e sociais no Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) surge da realidade, quando a convivência (participação de entidades na última reunião do Conselho Deliberativo do CNPq e no “Simpósio de Ciências Humanas e Sociais nas Políticas de Ciência, Tecnologia e Inovação Contemporâneas” deste ano, como exemplos) e os “critérios de cientificidade” apontam que o modo como estes campos do conhecimento são tratadas está errado.

As questões formuladas, os resultados e onde se quer tocar apresentam demandas, peculiaridades na pesquisa que as atuais resoluções, inclusive que deitam os comitês de ética e pesquisa, não conseguem alcançar (nem mesmo com as alterações das últimas resoluções). Vivenciar a pesquisa em ciências humanas traz ânimo profundo sobre a criação dessa diretoria. Posiciono-me como favorável porque do modo como os programas, os editais e a mobilidade acadêmica têm tratado as ciências humanas e sociais nos colocam em uma situação de pouca relevância (impressões minhas). Quando se diz que educação formará recursos humanos (vejo também na educação outras tarefas para sua meta pedagógica), mas não compõe a agenda de pesquisa nacional (agricultura, indústria, saúde, defesa, ambiente, energia e segurança, etc.) se alimenta o discurso da sua transversalidade para ofuscar seu potencial papel (o que tende ao reducionismo das ações). A validade, claro, não está no discurso, mas também não é sentida na prática.

Vemos a reprodução de desigualdades na ciência, mesmo com fenômenos, objetos e estruturas externas e internas distintas. Dignidade e autonomia devem ser respeitadas em pesquisas que envolvem seres humanos, minimizando riscos, protegendo a vida, etc. Mas ter um projeto de pesquisa aprovado nos Comitês de Ética em Pesquisa (CEP’s) não é simples, adequações e mais adequações, modificações exigidas que não têm o mínimo de significância.
Temos sobrevivido ao atual sistema dos CEPs e acompanhamento do Conselho Nacional de Saúde. As especificidades éticas das pesquisas nas ciências sociais e humanas não estão contempladas em resoluções, e isso precisa ser debatido para a aplicabilidade. Vislumbrar essa diretoria é, de algum modo, a constituição de um espaço para (re)formulações, tendo em vista que o pesquisador luta contra as amarras e encontra caminhos para a consecução da sua pesquisa.

Neste momento, após a reunião do dia 26 de dezembro, a nova diretoria do CNPq será submetida ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e outras instâncias governamentais. Assegurar que as ciências humanas e sociais não serão mais vinculadas à Diretoria de Engenharias, Ciências Exatas, Humanas e Sociais (DEHS) não determina sua valorização, mas é um passo importante para esta longa caminhada de rupturas, possíveis e necessárias.

*Hercília Melo  é doutoranda em Educação pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e secretária geral da Associação Nacional de Pós-graduandos (ANPG).

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