ANPG: 31 anos na defesa da pós-graduação, ciência e de um Brasil democrático e mais justo

carteira de estudante

Darcy Ribeiro uma vez nos falou que “O mais importante é inventar o Brasil que nós queremos”. E com e por causa desse sonho, há exatamente 31 anos, aos doze dias de julho de 1986, a sociedade brasileira testemunhava a fundação da Associação Nacional de Pós-Graduandos (ANPG) durante a 38° reunião da Sociedade Brasileira pelo Progresso da Ciência, ocorrida na Universidade Federal do Paraná.
Uma invenção do movimento de pós-graduandos que resistia bravamente as repressões, coerções e cerceamento de direitos da ditadura civil-militar, lutando pela democracia e por mais direitos para a categoria. Assim, em meio a redemocratização do país e do debate sobre o 3° Plano Nacional de Pós-Graduação (PNPG), a ANPG nascia para dar voz nacionalmente aos pós-graduandos (PG), congregar e fortalecer uma rede de entidades e colaboradores que desde meados dos anos 70 lutavam por melhores condições de pesquisa além do desenvolvimento econômico, cientifico e tecnológico do país.
E como não poderia ser diferente, ao longo de sua história, a ANPG vem travando lutas por mais direitos para os pós-graduandos, além da defesa intransigente de um projeto nacional que valorize a Ciência e Tecnologia (C &T) no país. Em seus primeiros anos de vida, mesmo com as dificuldades iniciais, a entidade já se articulava com a Assembleia Nacional Constituinte para aprovar o reconhecimento da C & T na Carta Magna de 88, e com Congresso Nacional para aprovação do Projeto de Lei (PL) dos Pós-Graduandos (PL 2405/89), já encampando a bandeira dos direitos previdenciários para os PG, valorização da bolsa e licença maternidade.
A cada ano que passava, a entidade se fortalecia e se consolidava na comunidade acadêmica, no movimento social e no âmbito institucional, jogando papel decisivo para as lutas que se avizinhavam na década de 90. Embora tenha sofrido derrota com o arquivamento do PL 2405, a ANPG logrou algumas vitórias na última década do século XX, derrotando grandes pautas do Governo Collor que ameaçavam a pesquisa brasileira, participando do movimento Caras-pintadas, juntamente com a UNE e UBES, e conquistando uma vaga no então Comitê Técnico- Científico da Capes. Essa última, deu oportunidade concreta dos pós-graduandos atuarem na disputa das políticas públicas de desenvolvimento da pós-graduação no Brasil assim como da pesquisa no país. Além disso, a entidade também protagonizou uma grande resistência na era FHC contra o desmonte da Universidade Pública e do sistema de C&T.
Embora tenha vivido um de seus momentos mais difíceis, com a renúncia de mais da metade de sua diretoria em 1998, em meio a grave crise econômica e social que assolava o país, a entidade chegava ao novo milênio renovada e com novos desafios. Além de ter um papel mais ativo na Frente Nacional em Defesa da C&T, foi protagonista no debate sobre o 4° Plano Nacional de Educação, defendendo uma de suas mais antigas bandeiras, a da educação pública e de qualidade.
Com a eleição do primeiro operário para presidência da República, abriu-se o caminho do diálogo do governo com a entidade, que foi recebida pela primeira vez pelo Ministro da Ciência e Tecnologia para discutir as perspectivas para o setor de C&T, a Lei de Inovação e a revisão dos critérios de avaliação da Capes. Nesse sentido de maior diálogo, a ANPG consegue suas primeiras conquistas dos anos 2000: a retomada da discussão do PL dos pós-graduandos e um reajuste da bolsa após nove anos de congelamento. Não obstante, a entidade conquistou mais espaços participando da Conferência Mundial sobre Educação Superior promovida pela UNESCO, um assento no Conselho Nacional de Juventude e a aprovação do 4° PNPG.
As conquistas dos anos 2000 não pararam por aí. Pela primeira vez em sua história, a ANPG participava ativamente da construção das políticas públicas para a expansão da universidade pública e da pós-graduação além do sistema de C, T e Inovação, com a implementação de projetos, tais como o Programa do Governo Federal de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais Brasileiras (REUNI) e o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) da C&T que entre outras coisas permitiram novamente o reajuste das bolsas da Capes e um investimento massivo para o setor.
O fim da primeira década desse novo milênio trouxe novos desafios para a entidade uma vez que o Brasil tinha experimentado diversas conquistas sociais, desde o combate à extrema pobreza até o incremento de investimento na Educação, Ciência e Tecnologia que refletiu no aumento da produção cientifica e da pós-graduação no Brasil. Desafios que tinha como carro chefe a busca por políticas públicas que conseguissem aparar socialmente aqueles que estavam no meio entre estudantes e profissionais formados.
E é nesse sentido, em meio a ampliação do Sistema Nacional de Pós-Graduação e representando cada vez mais pós-graduandos, que a entidade teve sua combatividade refletida na conquista de uma bandeira histórica: uma vaga no Conselho deliberativo do CNPq, fazendo valer a voz dos pós-graduandos nesse órgão. Além disso, o seu poder de liderança e mobilização permitiram a criação de uma campanha pela valorização da bolsa que já atingia quase 1500 dias sem reajuste. A massiva campanha pelo reajuste mobilizou nas universidades e nas redes os pós-graduandos de todo o Brasil que pararam suas atividades por um dia. Após a conquista do reajuste, chegava a hora de retomar a luta pela valorização do pós-graduando, com a garantia de mais direitos!
Nessa mobilização por mais direitos, a ANPG aprovou em seu 24º Congresso Nacional de Pós-Graduandos, um documento de direitos e deveres do Pós-Graduandos que devem balizar as discussões para construção dos instrumentos normativos. Participou ainda, ativamente na articulação para aprovação do Estatuto da Juventude e do Plano Nacional de Educação (2014/2024) que entre suas metas destaca atingir a titulação anual de 60 mil mestres e 25 mil doutores.
Metas que correm risco de não serem cumpridas assim como as estabelecidas no Plano Nacional de Pós-Graduação (2010/2020) devido ao agravamento da crise econômica e aprofundamento da crise política que se alastra desde o último quartel de 2014. Crise provocada por forças políticas inconsequentes que surrupiaram o voto popular, afastando uma presidenta democraticamente eleita que não possuía contra si crimes de responsabilidade que justificasse tão processo. E o fizeram, atacando gravemente as instituições democráticas do país no intuito de colocar novamente em voga um projeto anti-democrático, impopular e entreguista que vem desmontando o Estado brasileiro, tolhendo direitos sociais e trabalhistas e abrindo portas para retrocessos que atentam ao estado de bem-estar social que aos poucos viemos construindo em nossa história.
Diante desse cenário nebuloso, no início de uma quarta década de vida, novos desafios se descortinam para ANPG e os pós-graduandos que embora situados em uma conjuntura difícil não perdem as esperanças de inventar um Brasil novo. E é esse desejo insistente que não permite nos furtarmos da responsabilidade histórica que temos com a sociedade brasileira na defesa intransigente da soberania do país e de nossas instituições. E que fazem com que mais uma vez na história da ANPG, a entidade filha da abertura democrática, se vê tendo que defender a democracia, tão cara para o povo brasileiro, encampando a campanha por Diretas Já! Ao mesmo tempo que cerra as fileiras na resistência aos retrocessos diários impostos por um governo e um Congresso Nacional que possui um projeto político de voltar ao passado, tolhendo direitos sociais e trabalhistas, desmontando as universidades e centros de pesquisas públicas e todo o sistema de C, T & I, solapando qualquer oportunidade de retomada do desenvolvimento econômico soberano do país e de justiça social. Ademais, como não poderia ser de outra forma, erguer-se mais uma vez o desafio constante de mobilizarmos cada vez mais pós-graduandos, a comunidade cientifica e os demais setores da sociedade para a luta política na defesa daqueles que são elemento fundamental no processo de produção cientifica: os estudantes de pós-graduação.
Foi esse desejo e sonho de inventar o Brasil que permitiram que a nossa história se confunda com a história da defesa do povo brasileiro. E que mesmo após 31 anos de existência continuemos a lutar por um Brasil democrático, justo, com uma pós-graduação democrática, uma ciência valorizada e uma universidade cada vez mais popularizada.
Parabéns a ANPG e todos os pó-graduandos. Vida longa à Associação Nacional de Pós-Graduandos!
 

Vinícius Soares – Biólogo pelo ICB/UPE, mestrando em Biologia Celular e Molecular Aplicada pela UPE, coordenador geral da Associação de Pós-Graduando da UPE e Vice-Presidente Regional Nordeste da Associação Nacional de Pós-Graduandos