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Welington Oliveira de Souza dos Anjos Costa, Tesoureiro da Federação Nacional dos Pós-Graduandos em Direito e Diretor da ANPG em Direito dos Pós-graduandos

 
A Federação Nacional de Pós-graduandos em Direito – FEPODI teve importante participação no recente XXVI Congresso da Associação Nacional dos Pós-Graduandos – ANPG, discutindo acerca dos direitos dos pós-graduandos, principalmente questões relacionadas aos direitos trabalhistas e previdenciários do acadêmico pesquisador durante seu período de pós-graduação.
Nos dias de hoje, os pós-graduandos, enquanto pesquisadores e bolsistas estão completamente desamparados de garantias trabalhistas e previdenciárias. Algumas conquistas foram alcançadas pela mobilização dos movimentos estudantis, tal qual a licença maternidade para a pós-graduanda, entretanto há muito por caminhar ainda em busca da qualidade da pesquisa.
Atualmente, tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei n. 10.676/2018, que trata da garantia de direitos previdenciários aos pós-graduandos. Há casos em que se permite que este exerça atividades remuneradas, desde que haja autorização do orientador do pesquisador bolsista, entretanto a atividade da pesquisa exige uma participação presencial e constante dos pós-graduandos. Após a graduação, entre o início do mestrado e a conclusão do doutorado, há um lapso temporal de no mínimo 05 (cinco) anos, não havendo contabilização desse período como atividade trabalhista tampouco contribuição com a previdência social.
O pós-graduando permanece à margem de diversos benefícios decorrentes da Previdência Social, a exemplo do auxílio acidente, auxílio doença, dentre outros e, portanto desponta à discussão a necessidade de decidir o caráter do trabalho exercido por este. Atualmente, a atividade exercida pelo pós-graduando não possui natureza trabalhista, mas não se diferencia dela em muitas questões, principalmente em relação à dedicação exercida pelo acadêmico no curso. A desconsideração dessa relação acaba por desmerecer o trabalho do pós-graduando e gera situação de insegurança jurídica quanto à possibilidade de recebimento de benefícios previdenciários e futura aposentadoria.
Desta forma, o pleito atual dos bolsistas pós-graduandos é exatamente a consideração do caráter trabalhista de suas atividades de pesquisa para fins de incidência no regime da previdência social, contribuindo mensalmente com o valor correspondente a 5% (cinco por cento) do salário mínimo, especialmente para que os valores não o onerem em demasia e, em contrapartida, subsidiem a Previdência Social com a respectiva contribuição. A FEPODI, agindo também em representação, entende que o projeto é salutar à efetiva consideração do trabalho exercido pelo pós-graduando, que não pode ser considerado em separado do trabalho protegido pela legislação. É certo que atualmente o pós-graduando movimenta a pesquisa brasileira e seu desenvolvimento indubitavelmente depende da participação e, sobretudo, consideração destes como trabalhadores em função da área que atuam.
Outrossim, em casos de possibilidade de exercício de atividade remunerada à parte da pesquisa, a Portaria Conjunta n.1 de 15 de julho de 2010 permite que, havendo autorização do orientador, bem como a compatibilidade com a pesquisa e seu não-prejuízo, o pós-graduando pode exercer atividade fora do âmbito Universitário, o que poderia vir a auxilia-lo. Entretanto, dita resolução encontra pontos contra os quais os pós-graduandos divergem, a exemplo da necessidade de que a atividade seja exercida apenas após a concessão da bolsa e não antes, bem como a grande margem de liberalidade por parte do orientador na chancela do direito ao trabalho externo. Para que tal situação não seja utilizada como meio de assédio moral, o pleito é no sentido de dar previsão de recurso contra eventual negativa do orientador.
O fato é que, de todas as óticas, o trabalho do pós-graduando é desvalorizado, razão pela qual as entidades de representação, a exemplo da Federação Nacional dos Pós-Graduandos em Direito – FEPODI e Associação Nacional dos Pós-Graduandos – ANPG, vêm lutando pelo reconhecimento da atividade de pesquisa exercida pelo pós-graduando e, consequentemente, a concessão de direitos dela decorrente em razão da importância das mesmas.
REFERÊNCIAS
Associação Nacional dos Pós-Graduandos – ANPG. Previdência para os pós-graduando: agora é projeto de lei de número 10676/2018. Disponível em:< https://www.anpg.org.br/previdencia-para-os-pos-graduando-agora-e-projeto-de-lei-de-numero-106762018/>. Acesso em 31 jul. 2018.

Yuri Nathan da Costa Lannes, Presidente da Federação Nacional dos Pós-Graduandos em Direito – FEPODI;

Marianny Alves, Diretora de Eventos Acadêmicos da Federação Nacional dos Pós-Graduandos em Direito – FEPODI;

Welington Oliveira de Souza dos Anjos Costa, Tesoureiro da Federação Nacional dos Pós-Graduandos em Direito – FEPODI.

 
 
 
 
 

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Mateus Fiorentini, Diretor de Relações Internacionais da ANPG

Não é de hoje que alertamos para o fato de que a atual ofensiva conservadora que vivemos constitui-se em estratégia continental promovida pelas forças atrasadas e subalternas da nossa região. A situação argentina que atira o país em uma crise sem precedentes, corta recursos das universidades e ataca os direitos das mulheres é um bom exemplo dessa realidade. No nosso país vizinho leva-se adiante um roteiro idêntico ao vivido no Brasil. Na Venezuela, a situação de milhares de imigrantes que cruzam a fronteira brasileira em busca de melhores condições de vida instrumentalizam a campanha contra a soberania do país e lhes impõem duras condições. Além disso, revelam a desmoralização do papel internacional do Brasil e suas relações exteriores.
A Venezuela vive uma situação grave. O peso do petróleo na economia do país, em um cenário de crise econômica mundial e o controle de setores importantes do empresariado sobre a circulação de mercadorias tem dado contornos cada vez mais complexos para a realidade do país vizinho. Essa realidade se agrava na medida em que setores da economia e da política venezuelana, bem como internacional, instrumentalizam tal cenário para seus interesses. Assim, os meios de comunicação hegemônicos apregoam que milhares de venezuelanos fogem do país vizinho supostamente destruído pela ditadura bolivariana de Nicolás Maduro. O que os meios não revelam é que diante da crescente xenofobia produzida pela mesma campanha, as humilhações e as condições de superexploração do trabalho dos venezuelanos têm feito com que muitos deles retornem ao seu país. Segundo a BBC, mais de 56 mil venezuelanos deixaram o Chile e retornaram à Venezuela. Apenas no ano de 2017, 8 mil 425 pessoas que tentaram ingressar ao Chile na condição de refugiados foram “devolvidas” a seus países de origem: o número mais volumoso era de colombianos. No caso brasileiro, mais de 60% dos imigrantes venezuelanos já deixaram o território brasileiro, segundo o estudo de Ana Cristina Bracho, divulgado pelo site misionverdad.com. Entretanto, pouco se fala nos meios de comunicação dominantes sobre a imigração colombiana, por exemplo. Atingida por um conflito social e armado por quase 60 anos o número de imigrantes é imensurável. Somente na Venezuela residem mais de 6 milhões de colombianos que possuem todos seus direitos de cidadania garantidos. Entretanto, do militarismo, perseguições, falsos positivos, desaparecimentos e migrações forçadas promovidas pelo Estado colombiano ocupam poucas páginas nos periódicos hegemônicos. Para ilustrar, 7% dos nascimentos na Venezuela são de colombianos, 20% das casas concedidas pelos programas de moradia do governo são destinados a imigrantes desse país, além de 15% das consultas médicas realizadas no estado fronteiriço de Mérida, em hospitais venezuelanos portanto.
A estratégia do golpe é meticulosa e cirúrgica e se dirige a pontos estratégicos.. Ao vencer as eleições na Argentina e derrubar Dilma, o imperialismo ataca as duas principais economias da região, atores importantes no processo de integração da América Latina e o diálogo com os BRICS. Com o golpe no Brasil obras estratégicas como a construção do porto de Mariel em Cuba ficam sob ameaça e de quebra as multinacionais se apoderam do petróleo do pré-sal que fariam do Brasil o 5º maior produtor do recurso do mundo. Como se não bastasse, ressuscitam projetos como a da cedência da Base de Alcântara no Maranhão para uso Norte-americano. Esse projeto, surgido durante o governo FHC e enterrado por Lula, retorna pelas mãos dos golpistas. O mesmo vale para a Nicarágua. Ali inflou-se a mobilização popular, distorceu-se pautas legítimas do povo com o objetivo de melar a construção do Gran Canal Interoceánico construído com apoio chinês, duas vezes maior que o Canal do Panamá, controlado pelos EUA. Ao atacar a Venezuela, os EUA miram nas grandes reservas de petróleo deste país da mesma forma que o contraponto ideológico mais importante à política de anexação promovido pelo “Big Brother”. Sem a análise dos aspectos geopolíticos contidos na atual estratégia da direita Latino-americana é impossível compreender a realidade nacional.

A recente visita do Gal James Mattis, comandante da política de defesa norte-americana é um sinal do agravamento dessa situação. Além do Brasil, o roteiro inclui também Argentina, Chile e Colômbia e tem por objetivo tratar do tema “Venezuela”. O envio de tropas brasileiras para a região da fronteira do país se soma a iniciativa de outros países, o argumento do Planalto é que tal iniciativa se destina a garantir a segurança de brasileiros e venezuelanos. Porém além do Brasil, Chile e Colômbia já enviaram militares para a zona de fronteiras. Aliado a isso, imediatamente após a visita do Gal Mattis, um “navio hospitalar” do exército norte-americano ancorou nas margens da Colômbia para suposta ação humanitária. É preciso estar atento as movimentações na região, esperando que Michel Temer não promova a colombização da política externa brasileira aderindo a estratégia de provocações e a belicosidade na relação com os nossos vizinhos à serviço do governo dos EUA. Reivindicamos mais uma vez os postulados estabelecidos pela Comunidade de Estados Latino-americanos e Caribenhos (CELAC) ao declarar América Latina como zona de paz. A xenofobia e a agressão aos nossos vizinhos não combinam com a diversidade do povo brasileiro, muito menos com a história da política internacional do Brasil.

Mateus Fiorentini, professor de história graduado pela PUC-SP, mestrando junto ao Programa de Pós-graduação em Integração da América Latina da Universidade de São Paulo, Diretor de Relações Internacionais da ANPG e membro do Comitê Brasileiro de Solidariedade com a Venezuela.

*As opiniões aqui reproduzidas são de responsabilidade de seus autores e não representam, necessariamente, a opinião da entidade.
 

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Creditos da Foto : Guilherme Oliveira/ Oliverotto Fotografia

No dia 26 de agosto se comemora o Dia Internacional da Igualdade Feminina, em alusão a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão que ocorreu nesse mesmo dia em 1789 na França. Essa data é um marco para a conquista do movimento de mulheres ao longo da história, e tem como objetivo refletir sobre o combate à
desigualdade de gênero, buscando assim garantir a elas a plena igualdade.
No Brasil, obtivemos inúmeras conquistas nos últimos anos, com destaque para a Lei Maria da Penha que é um dispositivo legal que criou mecanismos punitivos contra a violência doméstica e intrafamiliar, sancionada no ano de 2006. Esta lei não é fruto do acaso. Na verdade, ela foi criada graças a uma condenação que o Brasil sofreu pelo não cumprimento do acordo da Convenção de Belém do Pará, que ficou conhecida como
Convenção Interamerica para Combater, Prevenir e Erradicar a Violência contra a mulher, entendendo que esse tipo de violência é uma violação dos direitos humanos.
Apesar de termos conseguido a inclusão na legislação deste importante ponto,ainda existem muitas vitórias a serem conquistadas. O Brasil ocupa hoje 90º posição do ranking do Fórum Econômico Mundial que analisa a igualdade entre homens e mulheres, apesar de apresentar um crescimento no que se refere à saúde e a educação, a discrepância na participação política ainda é muito dispare.
No legislativo, por exemplo, a participação feminina é ínfima, dos 513 mandatos na Câmara Federal apenas 51 são representados por mulheres (10%). No Senado, o cenário não é diferente, das 81 cadeiras apenas 13 (16%) são ocupadas por mulheres. Se observarmos o caso de Minas Gerais, a situação é ainda mais caótica: na Assembleia Legislativa do estado, dos 77 mandatos parlamentares, apenas 6 são ocupados por
mulheres, ou seja, menos de 10%.
A baixa participação feminina na política se explica, principalmente, pela lógica organizacional da nossa sociedade, o patriarcado. O espaço que é reservado às mulheres nessa concepção é o espaço privado, ou seja, o “da casa”, dos serviços domésticos, do cuidado com os filhos e familiares, etc. Seria, a grosso modo, o que se denomina popularmente de “bela, recatada e do lar”. Nesta lógica, a vida pública é conferida
somente ao homem, que passa a assumir o papel de único e inquestionável líder do
núcleo familiar, bem como da vida política.
Para se romper com esse círculo cruel, é fundamental emancipar as mulheres desta opressão velada (ou até explícita) garantindo a estas, entre outros direitos, a participação na vida política. Inúmeras mulheres ocuparam a política, pois se engajaram em lutas do seu cotidiano como a criação de creches para os seus filhos, para que se fosse possível ingressarem e/ou permanecerem no mercado de trabalho garantindo a sua
autonomia econômica.
A maior parte do eleitorado brasileiro é composto por mulheres, segundo dados do Cadastro Eleitoral são ao todo 77.337.918 representando 52,5% do total de eleitores. Ao olharmos esse dado, fica explicita a importância de mulheres votarem em mulheres, caso isso ocorresse o cenário na Câmara Federal, no Senado e na ALMG se transformaria radicalmente, e certamente teríamos um espaço muito mais amplo pra colocar em pauta as demandas das mulheres. Aproveitando a deixa, uma vez que esse ano é um ano eleitoral e teremos que escolher uma parte significativa de nossa representação no legislativo, priorize o voto em mulheres de luta!
 

Raphaella Karla Portes Beserra é licenciada em Geografia pela Universidade Federal
de Uberlândia, mestranda em Geografia pela Universidade Federal de Goiás (UFG –
Campus Catalão) e Presidenta da União Brasileira de Mulheres (UBM) na cidade de Uberlândia – Núcleo Rosalina.

*Publicado originalmente no Jornal Mais Minas

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A Organização Mundial da Saúde (OMS) anunciou nesta segunda-feira (18) uma decisão além de histórica revolucionária para a vida humana  a transexualidade foi oficialmente excluída da lista de doenças mentais da agência da Organização das Nações Unidas (ONU).
Em seu site institucional, a OMS publicou a mais nova revisão e catalogação do manual de Classificação Internacional de Doenças (CID-11) que retira a  “incongruência de gênero” – como a transexualidade é chamada no manual – da lista de transtornos mentais, onde constituem doenças como a pedofilia ou a cleptomania. Agora, a “incongruência de gênero” recebeu a classificação de “condição relativa à saúde sexual”, uma maneira encontrada pela agência para incentivar a oferta de políticas públicas de saúde para esta população.
A visibilidade alcançada até aqui deve ser reconhecida como conquista e orgulho para estas pessoas que sofrem tanto com o preconceito, porém a carência de medidas públicas e sua aplicabilidade compõe o cenário que de atual não tem nada, se fizermos uma reflexão mais profunda ao analisar as pessoas travestis e transexuais por classe social verificamos que em sua maioria são pobres e extremamente em condições de vulnerabilidade, expropriadas suas capacidades cognitivas, imagéticas e reduzidos a objetivo pelo simples fato de ser diferente.
Preconceito, exclusão, dificuldade no acesso educacional, indisponibilidade de vagas no mercado de trabalho, violação de direitos. Esses são alguns dos desafios diários enfrentados por travestis e transexuais no Brasil. O país lidera os rankings de violência segundo levantamento da ONG Transgender Europe. Em um período de sete anos, de 2008 a 2015, 802 mulheres trans e travestis perderam suas vidas no país, o que evidencia uma realidade de severa intolerância.
O combate à discriminação e a defesa de direitos devem ser compreendidos não sob o equivocado prisma da criação de novos direitos, mas sim sob a correta ótica da aplicação dos direitos humanos a todos, indiscriminadamente. Trata-se da aceitação dos princípios fundamentais sobre os quais todos os direitos humanos estão assentados: a igualdade de valores e a igualdade de dignidade de todos os seres humanos.
Com esta modificação a OMS permanece a transexualidade dentro de sua classificação para que as pessoas possam obter ajuda, já que em muitos países o sistema público ou privado de saúde não reembolsa o tratamento se o diagnóstico não estiver na lista.
Reconhecimento é o poder para nós pessoas transexuais. Somente quando a visibilidade é concedida e legitimada podemos levantar nossas forças e com sonoridade defender nossos direitos enquanto seres humanos.
Isis Ferreira, diretora de Combate às opressões ANPG

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Isis Ferreira, Diretora de Combate às Opressões da ANPG

Atendendo o dispositivo do Decreto n.º 8.727, de 28 de abril de 2016, o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) atualizou o formulário de preenchimento do Currículo Lattes, permitindo aos usuários a identificação pelo nome social e respectivo gênero. O nome é a nossa primeira identidade social que recebemos ao chegar a este mundo, e ter um nome que não condiz com seu gênero é muito difícil no dia a dia das pessoas travestis e transexuais.
O nome civil representa uma pessoa não somente pelo seu gênero, mas pelo seu conjunto de arcabouços que a pessoa constrói ao decorrer de sua vida. Com isto, o nome social é uma questão de dignidade humana aliada a representatividade. Portanto, hoje há legislações referentes ao nome social por todo país. É algo simples, porém de suma importância para que travestis e transexuais possam existir em espaços públicos, sendo reconhecidos pelo gênero que se reconhecem. Reconhecer a existência de forma real da pessoa enquanto cidadão é elementar para o convívio em coletividade, uma vez que nós enquanto seres humanos temos nossas particularidades e pluralidades, a diversidade é intrínseca a todos nós.
Mediante a este contexto considera-se fundamental a inclusão do nome social no currículo Lattes, esta política não é um benefício para a comunidade LGBT+ e sim uma retratação por práticas de exclusão e marginalização que ainda permeiam a sociedade brasileira.  A implementação dessa política é de fundamental importância para a garantia do direito à educação, pois contribui para o acesso, a permanência e as condições equitativas de ensino-aprendizagem para esta população.
É necessário ressaltar que a maioria das pessoas travestis e transexuais no Brasil não possuem formação escolar e quiçá formação acadêmica, dar espaço na plataforma Lattes é importante, porém mais elementar ainda é a garantia de direitos para que estes cidadãos construam suas vidas através da ambiência acadêmica e saiam da margem da sociedade, estabelecer de fato o espaço do real e não do aparente apenas.
A visibilidade alcançada até aqui deve ser reconhecida como conquista e orgulho para estas pessoas que sofrem tanto com o preconceito, porém a carência de medidas públicas e sua aplicabilidade compõe o cenário que de atual não tem nada, se fizermos uma reflexão mais profunda ao analisar as pessoas travestis e transexuais por classe social verificamos que em sua maioria são pobres e extremamente em condições de vulnerabilidade, expropriadas suas capacidades cognitivas, imagéticas e reduzidos a objetivo pelo simples fato de ser diferente.
Preconceito, exclusão, dificuldade no acesso educacional, indisponibilidade de vagas no mercado de trabalho, violação de direitos. Esses são alguns dos desafios diários enfrentados por travestis e transexuais no Brasil. O país lidera os rankings de violência segundo levantamento da ONG Transgender Europe. Em um período de sete anos, de 2008 a 2015, 802 mulheres trans e travestis perderam suas vidas no país, o que evidencia uma realidade de severa intolerância.
O combate à discriminação e a defesa de direitos devem ser compreendidos não sob o equivocado prisma da criação de novos direitos, mas sim sob a correta ótica da aplicação dos direitos humanos a todos, indiscriminadamente. Trata-se da aceitação dos princípios fundamentais sobre os quais todos os direitos humanos estão assentados: a igualdade de valores e a igualdade de dignidade de todos os seres humanos.

Por Isis Ferreira, Diretora de Combate às Opressões da ANPG

*As opiniões aqui reproduzidas são de responsabilidade de seus autores e não representam, necessariamente, a opinião da entidade.

 

Muito se fala sobre atingir a equidade de gênero, e a na perspectiva feminista, para que isto aconteça, deve haver uma mudança nas estruturas da sociedade: na política, justiça, economia, educação… Para Guacira Lopes Louro, todas essas instâncias, práticas ou espaços sociais são produzidas e construídas a partir de relações de gênero, classe e etnia. Portanto, isto não poderia ser diferente dentro da academia. Diversas autoras, como por exemplo Sandra Harding, Isabelle Stengers, Lélia Gonzáles e tantas outras formularam discussões sobre o fato da produção do saber científico ser, ainda, um campo extremamente masculinizado, seguindo um padrão branco e ocidental. Este movimento de uma crítica feminista à ciência é crescente desde a década de 70, e mesmo 40 anos depois, continua sendo um debate extremamente atual.
Quantas autoras lemos quando recebemos a ementa dos nossos cursos de graduação e pós-graduação? E dentro das salas de aula, quantas professoras tivemos? Quantas delas são mulheres negras, indígenas?
Quando fazemos estas reflexões, percebemos as contradições dentro das Universidades e do magistério no geral. É muito comum ouvirmos que a docência é um espaço “feminino”. Mas por quê?
O gênero e a raça são categorias utilizadas para designar relações e papeis sociais. Constrói-se o que é considerado feminino e masculino, padrões de comportamento e traços de personalidade. Desta forma, homens e mulheres também vivenciam o espaço de diferentes formas. O espaço da esfera pública é considerado como do trabalho produtivo, dos direitos, dos homens. Já o espaço privado, do lugar do doméstico, do cuidado. Essas dicotomias se perpetuam e são vistas no espaço acadêmico.
Geralmente espera-se que as mulheres estejam a frente de profissões onde é necessário o cuidado, a atenção. Esta é uma das razões pelas quais o magistério é uma profissão considerada feminina, principalmente na educação infantil – não é à toa que este segmento é popularmente conhecido, inclusive, como “maternal”. No Brasil, as escolas normais surgem em meados do século XIX, e sua composição discente majoritariamente é de mulheres – brancas em sua maioria e de famílias abastadas; o currículo era voltado às “prendas domésticas”. Mas foi a partir do século XX que se iniciou a “feminização” do magistério. Argumentava-se que as mulheres seriam mais adequadas à profissão por causa de traços relativos à personalidade, pelo fato do magistério ser visto como uma extensão ao lar e posteriormente, devido ao baixo salário – que afastou os homens, pois o magistério inicialmente era uma profissão masculina.
O magistério não significou liberdade – se formos pensar através do ponto de vista das mulheres brancas, visto que as desigualdades de gênero se dão de diferentes formas para mulheres negras, indígenas, LBT, idosas ou periféricas. Enquanto as mulheres brancas buscavam o empoderamento e o mundo do trabalho, a realidade das mulheres não-brancas era outra, visto que após a escravidão passaram a ocupar postos de trabalho como o doméstico ou outros trabalhos de baixa remuneração. O magistério para estas mulheres era visto como uma possibilidade de mobilidade social.
Porém, segundo o último Censo do professor (2007), ao mesmo passo que a educação infantil é ocupada majoritariamente por mulheres, ao longo desta trajetória, os cargos voltados para os anos finais da educação começam a ser cada vez mais ocupados por homens:
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Quando o trabalho sai da esfera da reprodução do cuidado para a produção do saber, os papeis se invertem. Ao observamos o número de docentes de instituições de Ensino Superior, esta diferença é ainda mais nítida:
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Porém, dentro da pós-graduação, o panorama é outro: No Censo de 2010, foram contabilizados 147.638 pesquisadores e, deste montante, 51% são homens e 49% são mulheres.
Segundo estudo de Andreia Barreto, 2014, sobre distribuição e representatividade da mulher no ensino superior, em 2010, as mulheres já constituíam maioria na população de mestres residentes no Brasil, porém sua remuneração mensal média das mulheres era cerca de 42% menor do que a dos mestres homens. Os dados são da pesquisa Mestres 2012 (Centro de Gestão e Estudos Estratégicos, 2012).
Já o número de doutoras,  de acordo com os dados da pesquisa Doutores 2010 (Centro de Gestão e Estudos Estratégicos, 2010), no ano de 2004, o número de doutoras tituladas ultrapassou o de homens no Brasil. Desde então, as mulheres são maioria no total de tituladas.
Porém, segundo dados do CNPq 76%, dos cientistas de nível sênior que recebem bolsas de pesquisa no país são homens. Ou seja, mulheres conseguem atingir no início da carreira científica, porém não dão continuidade às suas carreiras. Segundo o estudo Mapping Gender in the German Research, este abandono se dá por diversos fatores como sexismo no ambiente de trabalho e as duplas, triplas jornadas do trabalho doméstico – panoramas que não são muito diferentes do Brasil. O tempo que muitas mulheres poderiam estar se dedicando às suas pesquisas, estão na verdade cuidando de tarefas domésticas, do trabalho reprodutivo não remunerado, enquanto alguns homens usufruem deste tempo produtivo e criativo. A divisão sexual do trabalho e o sexismo enraizados na nossa sociedade são mais uma barreira na ascensão de mulheres pesquisadoras.
O magistério é ocupado por mulheres quando este tange a esfera do trabalho reprodutivo e do cuidado, professoras das series iniciais. Porém quando o trabalho envolve a produção de saber científico nas universidades, estes espaços começam a ser majoritariamente ocupados por homens, professores-pesquisadores.
Um dos caminhos a se seguir é legitimar as produções científicas das mulheres. Construir novas racionalidades e produções de saberes, afinal o acesso ao conhecimento científico ainda é um privilégio. O outro e tão sonhado caminho é a democratização do acesso à educação, para que um dia possamos construir um saber científico que não seja elitista, sexista e racista, e que esta não seja um privilégio para poucos.

Luyanne Catarina Lourenço de Azevedo (UERJ), Diretora de Mulheres ANPG

*As opiniões aqui reproduzidas são de responsabilidade de seus autores e não representam, necessariamente, a opinião da entidade.

 
 
 
 

 

               Nas áreas biológicas, para chamar atenção do estado atual de conservação de uma espécie de animal, planta ou outro organismo vivo, lançamos mão da Lista Vermelha, normalmente divulgada pela União Internacional para a Conservação da Natureza e dos Recurso Naturais. Se seguíssemos esse modelo e fosse possível publicar uma lista vermelha das instituições brasileiras que estão ameaçadas na atual conjuntura econômica e política, as universidades públicas estariam no topo da lista. E é sobre isso que devemos falar hoje.

            As universidades são aquelas instituições de ensino superior que provêm a famosa tríade de ensino-pesquisa-extensão. E em que pese, a primeira na América Latina tenha surgido já no século XVI, no Brasil ela só veio a ser fundada no início do século XX. E mesmo assim, com menos de um século de vida, as universidades públicas no Brasil desempenham papel fundamental para o desenvolvimento do país, contribuindo não apenas para formação de recursos humanos qualificados, mas também para produção científica, um fator estruturante para o desenvolvimento do país. Segundo a CAPES, cerca de 90% da ciência brasileira é realizada no âmbito da pós-graduação, e este setor majoritariamente está concentrado nas universidades.

            E para além da produção científica, a Universidade no Brasil historicamente tem sido lugar de resistência democrática, criando espaços de debates e críticas sobre os rumos do país. Tal fato se torna tão verdadeiro quando observamos que a instituição foi uma das primeiras a ser alvo da ditadura civil-militar que acometeu o país na década de 60. Ditadura essa que se iniciou realizando uma reforma que aliasse as universidades ao projeto político hegemônico da época, minando qualquer espaço de críticas sociais, além de calar a oposição ao regime autoritário que crescia intensamente. E, assim como foi no passado, após o golpe de 2016, a Universidade brasileira volta a se tornar um dos principais alvos daqueles que detêm a hegemonia do poder. E são ameaças vindas de vários meios e que precisam ser denunciadas!

            A primeira e mais visível ameaça chega por meio do estrangulamento do orçamento universitário, a ponto de algumas alertarem que o dinheiro disponível não é suficiente para sustentar suas atividades durante o ano todo. Os cortes e contingenciamentos realizados pelo governo federal, além de diversos estaduais, visam meramente o desmonte da universidade e não a economia do dinheiro público como alertam. E essa escassez de verba pública abre uma segunda fronte de ameaça: as privatizações. Defendidas com a desculpa de que o Estado brasileiro não tem recursos suficientes, as mesmas deveriam iniciar a cobrança de mensalidades para se sustentarem.

            Essa segunda ameaça vem sendo constantemente ecoada pela mídia brasileira através de editoriais pregando que precisamos pagar a conta de termos abertos as portas da universidade para o povo brasileiro. Os editoriais que já viraram projetos de lei e estão tramitando no Congresso Nacional (PLS 782/2015, de autoria do Senado Marcelo Crivella, e a PEC 366/2017, de autoria do deputado Andres Sanchez) pregam legalizar a cobrança de mensalidade para os cursos de graduação. Ambos projetos justificam a cobrança de mensalidades para aqueles que poderiam pagar, como uma forma de financiamento da universidade. E uma forma de convencer a sociedade em apoiar a causa é através da primeira ameaça, que deixa as universidades com déficit orçamentário. Déficit este causado pelos sucessivos cortes e contingenciamento no orçamento repassado para essas instituições. Entretanto, sabemos que esse debate é mais uma tentativa de voltarmos ao século passado, onde a universidade era um lugar para poucos, especialmente depois das mudanças que tivemos nos últimos 16 anos com a expansão do polo universitário brasileiro. Expansão que incluiu sua interiorização que permitiu a sua popularização e criação de oportunidades para aqueles segmentos que historicamente foram excluídos do acesso ao ensino superior. E é justamente pela universidade estar cada vez mais diversa em cores, gêneros e classes sociais, que setores conservadores da sociedade vêm defendendo a pauta da privatização das universidades.

            A terceira fonte de ameaça vem por meio de caçadas judiciais e policiais mascaradas de combate à corrupção. Contudo, não passam de tentativas de gerar mais argumentos a favor da privatização das universidades, desmoralizando as gestões das universidades, colocando em cheque a credibilidade dos gestores escolhidos pela própria comunidade acadêmica. Como exemplo dessas tentativas, temos as prisões arbitrárias de diversos reitores e ex-reitores de universidades como a UFJF, UFMG e UFSC, nesta última causando o suicídio do ex-reitor Carlos Cancellier.

            A quarta e talvez mais recente ameaça vem se dando com o cerceio da autonomia universitária, exercida por meio do judiciário, com objetivo de ditar o que deve ser ensinado na universidade. Esse fato vem sendo desnudado com a recente movimentação do Ministério da Educação, na pessoa do seu Ministro, Mendonça Filho, para investigar e proibir a disciplina “O Golpe de 2016 e o futuro da democracia” na Universidade de Brasília.

            É preciso denunciar que estas ameaças não estão desarticuladas e nem são espontâneas na atual conjuntura. Elas fazem parte de um projeto político antidemocrático e antinacional que visa a expulsão do povo de dentro das universidades, dentre outras coisas como retirada de direitos sociais, trabalhistas e previdenciários. Como consequência, tem-se a exterminação da função social da Universidade, que é a de servir a um projeto nacional de desenvolvimento econômico e social. É preciso estarmos atentos e defendermos esta instituição tão importante para construção de um Brasil independente, soberano e com qualidade de vida para o seu povo. Precisamos estar unidos e dialogar com a sociedade sobre a importância da universidade, denunciando estas e outras tentativas de continuidade do golpe de 2016, para que não apenas a universidade saia da lista de espécies ameaçadas de extinção, mas que possamos reconstituir o pacto democrático ferido em 2016.

Por Vinícius Soares – Biólogo pelo ICB/UPE, mestre em Biologia Celular e Molecular Aplicada pela UPE, coordenador geral da Associação de Pós-Graduando da UPE e Secretário-geral da Associação Nacional de Pós-Graduandos

*As opiniões aqui reproduzidas são de responsabilidade de seus autores e não representam, necessariamente, a opinião da entidade.

No dia 29 de janeiro o prof. Vahan Agopyan assumiu oficialmente a reitoria da USP (Universidade de São Paulo). O novo reitor homenageou com louvor a anterior gestão presidida pelo prof. Marco Antonio Zago (2014-2017), do qual foi vice-reitor[1].
Em sua candidatura Zago defendeu maior diálogo com a comunidade acadêmica e com a sociedade; repudiou a permanência da Polícia Militar na USP; defendeu uma universidade pública e autônoma, capaz de responder criativamente aos desafios dos problemas emergentes[2].
Deu no que deu, a gestão Zago foi presidida por uma onda de medidas privatizantes, antiacadêmicas e violentas[3]. Aprofundou a onda de desmonte e privatização de vários setores de suporte e apoio da USP, que teve início nas décadas de 1960 e 1970, chegando hoje a atuar mais de 30 fundações privadas nos Campi da USP, tornando-se mais nítido o alinhamento político-ideológico às medidas neoliberais de mercado.
Demitiu milhares de funcionários pela implementação do Programa de Incentivo à Demissão Voluntária (PIDV) e congelou os salários dos demais servidores com o Programa de e Incentivo de Redução à Jornada de Trabalho.
Na tentativa de coibir os movimentos estudantis, sindicais e sociais, Zago ordenou um ataque da Tropa de Choque da Polícia Militar contra estudantes e funcionários da USP que protestavam contra a PEC do fim da USP, no dia 7 de março de 2017[4].
Essas ações demonstram a linha de austeridade e do fascismo que os Estados e as universidades estão adotando, na esfera local, que são nada mais que o reflexo do golpe perpetrado governo ilegítimo de Temer. Tudo em nome da “governabilidade” diante de uma falsa crise orçamentária.
Em São Paulo a crise é engendrada por Alckimin e suas medidas de Renuncia Fiscal do ICMS para bancos e grandes empresas, que é o principal meio de arrecadação do governo.
Essa situação é destrinchada no informativo 444 da ADUSP[5]. Entre os anos de 2014 e 2017 o Estado de São Paulo deixou de Arrecadar R$ 92 bilhões do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e prestação de Serviços (ICMS), afetando fortemente o setor da educação.
O principal meio de arrecadação da USP, por exemplo, é exatamente o repasse de 5% do ICMS, ou seja, em quatro anos a USP deixou de arrecadar R$ 4,6 Bilhões, valor infinitamente superior ao déficit previsto por Vahan para 2018, cerca de R$ 200 milhões1. A crise orçamentária da USP não é financeira, mas sim política.
É este cenário que vem precarizando as Universidades Estaduais de todo o Brasil. Nós da ANPG e da APG-USP Capital nos colocamos contra as medidas de austeridade. Lutamos por uma universidade pública, com autonomia e de qualidade. E repudiamos as ações privatizantes, antiacadêmicas e violentas que têm se proliferado nas instâncias universitárias de todo o país.
 

Caian Cremasco Receputi, mestrando do Programa de Pós-Graduação Interunidades em Ensino de Ciências da USP, Diretor das Universidades Estaduais e Tesoureiro Geral da Associação de Pós-Graduandos Helenira “Preta” Rezende (APG-USP Capital).

 

[1] Discurso do novo reitor da USP, Vahan Agopyan, na cerimônia de posse – 29/01/2018. Disponível em: <http://jornal.usp.br/wp-content/uploads/DISCURSO-DA-POSSE-.pdf>.
[2] Discurso de posse de Marco Antonio Zago como reitor da USP, em 25 de janeiro de 2014. Disponível em:< http://www.iea.usp.br/iea/quem-somos/a-usp/discurso-de-posse-marco-antonio-zago-reitor>.
[3] Revista Adusp, Setembro 2017, nº 61. Disponível em: <http://www.adusp.org.br/files/revistas/61/RevistaAdusp61.pdf>.
[4] Moções de repúdio à violência policial no dia 7 de março. Disponível em: <https://www.adusp.org.br/index.php/demousp/2818-mocoes-de-repudio-a-violencia-policial-no-dia-7-de-marco>.
[5] Revista Adusp. Informativo 444, Novembro de 2017. Disponível em: <http://www.adusp.org.br/files/informativos/444/info444.pdf>.

*As opiniões aqui reproduzidas são de responsabilidade de seus autores e não representam, necessariamente, a opinião da entidade.

Uma instituição financeira internacional, o Banco Mundial, publicou um relatório criticando, entre outras políticas públicas no Brasil, o Ensino Superior público e gratuito. O documento contém inúmeros erros na apresentação do Sistema de Universidades Públicas Federais, que merecem reparo. Além disso, parte da justificativa afirma que as políticas públicas têm favorecido os mais ricos, mas não refere a acentuada injustiça tributária no país, muito menos recomenda a tributação de grandes fortunas ou a revogação de desonerações fiscais que favorecem grandes grupos econômicos, medidas que poderiam financiar iniciativas de combate à desigualdade, problema maior da nação. Limitado a indicadores financeiros, o documento ignora dados da realidade social brasileira e o papel das universidades públicas no desenvolvimento econômico e social do país.
A Associação Nacional de Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior, ANDIFES, informa que estão incorretos, naquele relatório, entre outros, os dados sobre o perfil dos discentes das Universidades Federais e sobre os investimentos públicos realizados nas instituições.
Entre outros fatos que o Banco ignora, estão os processos seletivos massivos, como o ENEM, a criação de mais de 300 campi no vasto interior do país, e a própria lei de cotas, que contribuem para que apenas 10% dos alunos matriculados nas Universidades Federais venham de famílias com renda bruta familiar de dez ou mais salários mínimos. Na outra ponta, 51% dos alunos das Universidades Federais pertencem a famílias com renda bruta abaixo de três salários mínimos. Se considerada a renda média per capita, 78% dos alunos são de famílias com renda per capita de até dois salários mínimos. Não há, portanto, fundamento para a afirmação de que os alunos das Universidades Federais pertencem aos estratos de renda mais altos da sociedade, muito menos que possuem capacidade financeira para pagar mensalidades.
Por outro lado, é verdade que os mais ricos deveriam pagar pela educação pública, mas não apenas os mais ricos que têm filhos nas universidades públicas. Uma política distributiva séria tributaria todos os ricos (com ou sem filhos nas universidades públicas) taxando fortunas, heranças e propriedades, a fim de possibilitar a parcelas maiores da população o acesso à educação pública de qualidade. Acrescente-se a isso o olhar simplista daqueles que reduzem a formação e a atuação dos egressos das universidades públicas a uma apropriação exclusivamente pessoal, sem considerar a contribuição estrutural às demandas de uma sociedade complexa por parte desses profissionais altamente qualificados.
O investimento em educação no Brasil é dos mais baixos entre todos os países da OCDE. Considerados todos os níveis educacionais, o Brasil só investe mais que o México. Fica atrás de todas as outras nações, inclusive do Chile, Coreia do Sul, Estônia, Hungria e Polônia. Considerada apenas a Educação Superior, o investimento do Brasil por aluno (US$/PPP 13.540,00) está abaixo da média da OCDE (US$/PPP 15.772,00), isso em um cálculo que inclui, para o Brasil, os gastos com os aposentados das universidades (gasto previdenciário), o que corresponde a cerca de 25% de todo o valor contabilizado.
Por fim, a afirmação de que o investimento por aluno em universidades públicas é maior do que o financiamento por aluno em instituições privadas é uma obviedade. As primeiras são responsáveis por quase toda a pesquisa científica e tecnológica realizada no país, gerando resultados econômicos extraordinários, como na produção de alimentos, na exploração de petróleo e no desenvolvimento de novas fontes de energia. São as universidades federais, também, as responsáveis por mais da metade do Sistema Nacional de Pós-Graduação, que forma mestres e doutores em todas as áreas de conhecimento, base da inclusão do Brasil na sociedade do conhecimento, inclusive com a elevação do país à condição de 13ª nação com maior participação em toda a produção científica mundial.
Além das inúmeras incorreções, o documento do Banco Mundial ignora aspectos fundamentais da atuação das Universidades Federais no Brasil. Inseridas em um ambiente social marcado pela desigualdade e pela exclusão, as Universidades Federais, públicas e gratuitas acolhem alunos de todas as origens sociais, raças e etnias, oferecem-lhes oportunidades e incluem em suas agendas de pesquisa e extensão questões que dizem respeito à promoção da cidadania. Mantêm uma rede de hospitais públicos de alta complexidade, além de clínicas, laboratórios e serviços diversos de atendimento gratuito à comunidade, sendo, muitas vezes, as únicas opções de acesso ao atendimento de saúde. Atuam em todas as mesorregiões do país, inclusive nas mais distantes e inacessíveis, e desenvolvem projetos inovadores para a geração de riqueza e renda, para o desenvolvimento sustentável e para a formação cultural.
A rigor, o que surpreende é que as Universidades Federais consigam resultados acadêmicos, científicos e sociais tão expressivos, apesar de se desenvolverem em um ambiente de políticas de financiamento instáveis e de ataques recorrentes dos grandes grupos econômicos, interessados em transformar a educação do país em fonte cada vez mais atrativa de ganhos financeiros. A questão que se coloca é: em qual país as recomendações do Banco Mundial, repetidas há décadas, levaram ao desenvolvimento e à soberania?
*Por Emmanuel Zagury Tourinho, reitor da Universidade Federal do Pará (UFPA) e presidente da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes).
*As opiniões aqui reproduzidas são de responsabilidade de seus autores e não representam, necessariamente, a opinião da entidade.

A Associação de Pós-Graduandos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (APG UERJ) está consternada com a notícia da morte do pós-graduando de Artes, veiculada por outros pós-graduandos no decorrer da semana. Primeiramente, solidarizamo-nos com a dor de seus familiares, amigos e toda a comunidade acadêmica do Instituto de Artes da UERJ.
Rodrigo Marques era aluno do Programa de Pós-Graduação em Artes (PPGArtes UERJ) desde 2015. Durante sua trajetória na instituição, o estudante já apresentava sinais de ansiedade e estresse, os quais se desenvolveram em um quadro depressivo. Rodrigo não conseguiu concluir o curso, foi reprovado na qualificação. Num sistema meritocrático e produtivista – em que a própria academia se insere – é comum o desenvolvimento de transtornos de ansiedade, depressão, pânico. As instituições acadêmicas tem como foco o resultado, de preferência em larga escala, sem se preocupar com a saúde mental do ser humano responsável por esta produção. Em momentos de crise, como acontece agora, estes quadros se agravam. Rodrigo se suicidou no dia 6 de dezembro de 2017.
A saúde mental dos estudantes na pós-graduação já se tornou uma questão recorrente, seja em conversas entre estudantes ou mesmo em artigos científicos. Com a popularização do acesso a cursos de pós-graduação nos últimos anos, o perfil do discente mudou, porém os programas em sua maioria não estão preparados para lidar com esse novo público. Em pesquisa divulgada pela Folha de São Paulo, só neste ano, os recursos para a ciência foram cortados em cerca de 40%, tornando-se os menores em mais de uma década. Uma parcela considerável dos estudantes de pós-graduação não trabalham pois em muitos casos é imposto um regime de dedicação exclusiva ao curso. Garantir a subsistência apenas com a bolsa é tarefa árdua, principalmente em cidades como o Rio de Janeiro. É importante ressaltar também que muitos estudantes não possuem bolsa. Em contrapartida, o produtivismo é algo inerente da academia e é do bolso do estudante que muitas vezes acaba saindo o dinheiro para apresentação de trabalhos em congressos – e mais uma vez, se a bolsa não garante a subsistência, o que dizer dos trabalhos a serem apresentados? Isso faz com que cobranças relativas à produtividade acabem gerando um mal-estar para quem não consegue produzir de acordo com o que lhe é cobrado. É nítido que há uma relação assimétrica de poder entre o professor orientador e os orientandos e a forma como estes lidam com esse tipo de questão demonstra como não estão preparados ainda para lidar com outras formas de pesquisa, gerando uma grande angústia e acarretando quadros clínicos de depressão, ansiedade, crises de pânico, como citados na reportagem da Folha.
Enquanto estudantes, sabemos que muitas vezes a forma como somos cobrados acaba gerando um certo pavor quanto ao curso e a pesquisa, trazendo à tona dúvidas sobre a continuidade ou não do curso. Infelizmente casos como o do Rodrigo tem se tornado frequentes e devem servir de alerta para todos e todas que estão dispostos a mudar a forma que o sistema opera. A forma com que o produtivismo é colocado é cruel e adoece. Precisamos pensar no ser humano que não é apenas produção. Falar sobre depressão e suicídio é caso de saúde pública, e não podemos ignorar estes casos dentro da pós graduação. A psicanalista e pesquisadora Maria Rita Kehl explicita em diversas entrevistas que a depressão cresce a níveis epidêmicos, justamente pela vivência no mundo atual se dar cada vez mais através da aceleração do tempo, desvalorizando questões psíquicas e trazendo um grande sentimento de vazio.
Porém, é importante salientar que nem sempre o suicídio acontece em decorrência de casos de depressão. Em setembro deste mesmo ano, o reitor Cancellier foi preso e acusado de obstrução de investigação em operação da Polícia Federal que acusava docentes de desvio de recursos em bolsas de educação à distância na UFSC. O reitor foi alvo de condução coercitiva e prisão provisória, tendo sido afastado das funções por decisão judicial. Tanto a administração da universidade, como Institutos, professores e estudantes manifestaram seu repúdio à forma com que essa operação foi conduzida e publicizada. Dezoito dias após o ocorrido, o reitor cometeu suicídio atirando-se de um shopping center de Santa Catarina.
A APG UERJ reforça que vivemos em um período de ataques às instituições públicas e tais práticas chegam mais uma vez à Universidade Pública Brasileira. Continuaremos a defender educação pública, gratuita e de qualidade, e mais investimento em pesquisa e inovação para fomentar a soberania nacional. Reiteramos a nossa defesa pelo direito ao contraditório e da presunção de inocência para todos os indivíduos, garantidos pela constituição cidadã de 1988.
Mais uma vez, apontamos para a necessidade de se falar sobre o suicídio. Segundo a OMS, a cada 40 segundos uma pessoa comete suicídio no mundo, em contraponto apenas 28 países relatam possuir como prioridade uma estratégia nacional de prevenção para o suicídio. Este pode ser, portanto, entendido e investigado como um fenômeno social, uma ação individual que, se observada mais aprofundadamente, questiona e denuncia falhas na regulamentação moral exercida pelo coletivo.
Da mesma forma que a publicização debate outros temas tabus que figuram entre a internet e jornais diários, como pedofilia ou incesto, contribuindo para a denúncia de práticas ilegais e para informar acerca de outras realidades, as notícias sobre suicídios poderiam obter o mesmo êxito, alcançando um gerenciamento dessa arena simbólica e proporcionar um compartilhamento de informações e experiências, promovendo debate e maior compreensão sobre temas sociais. A maioria das tentativas de suicídio permanece não relatada, assim como suas tentativas.
O psiquiatra Wolgran Alves Vilela, coordenador da área de Psiquiatria do Hospital de Clínicas da Unicamp, em entrevista à jornalista Miriam Abreu, declarou que histórias que envolvem suicídio podem ser divulgadas com tranquilidade, desde que os casos não sejam explorados de forma sensacionalista, e acrescentou: “A divulgação tem mais valor positivo do que negativo, já que aguça o interesse de estudiosos e autoridades, que tentam prevenir mais casos de suicídio”.
O suicídio não deve ser mostrado como inexplicável, muito menos de maneira simplista: Ele nunca é o resultado de um evento ou fator único. Normalmente sua causa é uma interação complexa de vários fatores como transtornos mentais e doenças físicas, abuso de substâncias, problemas familiares, conflitos interpessoais e situações de vida estressantes. Na pós-graduação os prazos apertados, pouco dinheiro, pressão para publicar artigos, carga de trabalho excessiva, cobranças, situações humilhantes, constrangimentos, solidão, assédio moral/sexual, desorientação (o que é muito comum também) somatizam esse descontentamento, reconhecendo que a combinação de uma variedade de fatores contribui para o suicídio.
O único caminho possível para elucidar essa triste realidade é o debate, o aprofundamento de reflexões, o diálogo entre estudantes e professores com a sociedade, num esforço coletivo voltado não só para prevenção, mas também para não escorregar em preconceitos, que tanto facilitam o encerramento de discussões difíceis, porém necessárias.

Manuelle Maria Marques Matias – UERJ
Diretora de Políticas Institucionais

*As opiniões aqui reproduzidas são de responsabilidade de seus autores e não representam, necessariamente, a opinião da entidade.