Debates simultâneos enriquecem o 23º CNPG

carteira de estudante

Campanha pela valorização das bolsas de pesquisa, combate ao racismo, defesa do meio-ambiente e do desenvolvimento, além de transparência no legislativo foram temas abordados neste primeiro dia de atividade.

Após a solenidade de abertura, com o objetivo de aprofundar o debate central do congresso, “Desafios do Brasil”, e discorrer sobre as pautas do Movimento Nacional de Pós-graduandos (MNPG), a programação do 23º CNPG seguiu com quatro grupos de discussões simultâneos: “O desafio da construção da igualdade étnica na universidade”; “Rio + 20: Ciência, Tecnologia e Inovação a favor da sustentabilidade”, “As dimensões do esporte e o seu papel no desenvolvimento humano”; e “O papel do CNJ na construção de um Poder Judiciário mais transparente”.

Para expor esses desafios, a entidade convidou personalidades como Ennio Candotti, vice-presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e diretor do museu da Amazônia; Alexandre Rosa, do Centro de Estudos e Memória da Juventude (CEMJ); e Mário Theodoro, da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR).

Os debates costuraram as atuais bandeiras da ANPG, comoa campanha pela valorização das bolsas de pesquisa, o combate ao racismo, além da defesa do meio-ambiente e do desenvolvimento, e foram realizados durante toda a tarde desta quinta-feira (03).

Sustentabilidade e memória na cidade e na floresta

O vice-presidente da Sociedade Brasileira pelo progresso da Ciência (SBPC) e diretor do Museu da Amazônia, Ennio Candotti, conduziu a conversa do grupo de discussão sobre “C&T sustentabilidade e memória na cidade e na floresta”.

Em sua fala, o professor defendeu quatro princípios para se pensar os desafios do Brasil. Em primeiro lugar, ressaltou que o conhecimento produzido sobre a natureza no país ainda é muito incipiente. “Estamos longe de poder contar com um estoque de conhecimento que nos permita com facilidade que rumos devemos tomar para conservar a natureza, por exemplo”, explicou.

Em segundo lugar, ressaltou a participação crescente de novos interlocutores no debate sobre preservação do meio ambiente. “Milhões de pessoas estão emergindo da pobreza absoluta e devem ser trazidas para a discussão”, justificou.

Além disso, Ennio também criticou duramente o sistema de créditos de carbono praticado e ressaltou a necessidade de ampliar a circulação de conhecimento. “Os caminhos do patenteamento, proteção e valorização avançam,mas, assim, há um cerceamento da circulação do conhecimento. Isso cria problemas na discussão da conservação do planeta”, finalizou. 

Sistema judiciário é blindado de controle social

Criado em 31 de dezembro de 2004 e instalado em 14 de junho de 2005, o CNJ é um órgão do Poder Judiciário com sede em Brasília/DF e atuação em todo o território nacional, que visa, mediante ações de planejamento, à coordenação, ao controle administrativo e ao aperfeiçoamento do serviço público na prestação da Justiça.Debater o papel do CNJ na construção de um Poder Judiciário mais transparente foi o objetivo do segundo grupo de discussão.

Para Alexandre Gustavo Melo Franco Bahia, professor adjunto do Departamento de Direito da Universidade Federal de Ouro Preto e da Faculdade de Direito do Sul de Minas e especialista em Direitos Fundamentais, Estado Democrático de Direito,Minorias, Ativismo e Reforma do Judiciária, anfitrião desse segundo grupo de discussão, o sistema judiciário possui uma série de deficiências.

O professor frisou uma grande dificuldade encontrada entre os sistemas judiciários de cada tribunal: “Os sistemas são diferentes e nãoconversam entre si”. Além disso, na opinião dele a eficácia de regulamentação do órgão ainda é muito ligada a quem preside a CNJ. “O CNJ funciona por fases,depende de quem esta na presidência, que pode diminuir ou aumentar os poderes do órgão, que é hoje deficitário”.

A corrupção no legislativo também foi foco do debate. “O judiciário continua blindado do controle social. Em todos os países falamos sobre mecanismos para coibir a corrupção no legislativo, aqui é tabu. Precisamos mudar isso”, afirmou.

Democracia racial: a grande falácia do país

A questão da desigualdade social e do preconceito que os negros e negras sofrem no Brasil (herança cotidianamente reafirmada de um 13 de maio de 1888 que significou mais uma mudança na metodologia de exploração da força de trabalho do que uma abolição de fato) é um assunto que normalmente causa polêmica. Até porque, muitos assinam embaixo que, em pleno século XXI, com tanto avanço nas discussões dos direitos humanos, é impossível haver discriminação por causa da cor de uma pele.

Para desmascarar a polêmica, a ANPG convidou Mário Theodoro, da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR), e Alexsandro do Nascimento Santos, consultor legislativo da Câmara Municipal de São Paulo, para uma discussão sobre o tema.

Ambos discorreram sobre o assunto com muito afinco e afirmaram, através de números e dados, que, para além dos efeitos da Lei Áurea, que está prestes a completar 124 anos em maio, trabalhadores e estudantes brasileiros ainda são subdivididos em classes, mesmo após avanços.O homem branco ganha mais do que o homem negro pela mesma função. O estudante branco tem mais oportunidades do que o estudante negro, mesmo sendo alunos do mesmo colégio.

Para Santos, o Brasil não foi capaz de garantir que os negros libertos fossem tratados com o respeito que seres humanos e cidadãos mereciam, no campo ou na cidade. “Herança maldita disseminada na sociedade. E alimentada por discursos como o de que existe democracia racial. Não vamos progredir enquanto não existir políticas afirmativas, como o sistema de cotas, inclusive para pós-graduandos”, avaliou.

Theodoro seguiu a mesma linha. “Antes de tratar todos com igualdade é preciso tratar os desiguais de forma desigual através de ações afirmativas. Só assim, poderemos sonhar – um dia – em que negros e brancos, homens e mulheres, não se sintam como se tivessem vindo com a roupa errada para a festa.”

Esporte para além das atividades físicas

O reconhecimento do esporte como canal de socialização positiva ou inclusão social é revelado pelo crescente número de projetos esportivos destinados aos jovens, financiados ou não por instituições governamentais. Na literatura em educação física, esportes e lazer, sociologia e em outras áreas, também são crescentes indicações dos benefícios proporcionados pela prática regular de esportes, na formação moral ou da personalidade dos seus praticantes.

O professor Alexandre Rosa, do Centro de Estudos e Memória da Juventude (CEMJ) e mestrado em Educação Física e Sociologia, foi convidado pela ANPG para discutir o assunto e aprofundar, principalmente, a questão da pedagogia do esporte. Segundo o professor, o esporte contemporâneo passa por um processo complexo e permanente de metamorfose.

“Podemos dizer que não há mais um estatuto de verdade absoluta, isto é, não há mais fronteiras bem delimitadas entre os saberes. Isto porque, hoje, várias são as áreas do conhecimento que contribuem para que o esporte cresça em sua cientificidade”, avaliou Rosa, que ainda explicou:

 “A pedagogia do esporte tem o compromisso de analisar,interpretar e compreender as diferentes formas esportivas à luz de perspectivas pedagógicas. Obriga-se, de certa forma, a refletir sobre o sentido do esporte como prática de formação e educação, de realização da humanidade e da condição humana no homem. O esporte é pedagógico e, por conseguinte, educativo, tendo em vista a sua possibilidade de proporcionar obstáculos e desafios, fazendo com que o aluno experimente as regras e aprenda a lidar com o próximo”.

Camila Hungria, de São Paulo.