Sobre o extermínio da juventude negra, geopolítica e comunicação nas Américas

carteira de estudante

Em recente colaboração para o debate crítico da Nação Hip Hop Brasil, organização de origem periférica a qual tenho orgulho de pertencer, escrevi um ensaio sobre a eleição estadunidense, apontei alguns caminhos para a compreensão do efeito Trump, e suas correlações mundiais, a direitização do mundo ocidental, o endurecimento na lida com as Maiorias Minorizadas e o retrocesso das políticas progressistas conseguidas nos últimos anos, especialmente para a gente base da pirâmide aqui da América Latina. Neste texto, “Sobre Hip Hop, Globalização e Eleições” (http://ujs.org.br/index.php/noticias/sobre-hip-hop-globalizacao-e-eleicoes-por-richard-santos/ ) aponto contribuições intelectuais do historiador e cientista político Moniz Bandeira que em seus escritos, denuncia uma articulação internacional para a retomada do poder de grupos suscetíveis a ceder para projetos e demandas progressistas vindas das minorias, como exemplo, veja seu último livro “A desordem mundial”. Esses processos por que passamos e que é muito bem analisado pelo professor, é responsável direto pelo recrudescimento da política no Brasil e retrocesso dos direitos sociais conquistados, concluo no texto para a Nação. Porém, também, é desse processo que passamos no momento atual que temos visto aumentar o encarceramento, assassinato e exclusão social das populações afrodescendentes nas Américas.
O pensador camaronês Achille Mbembe classifica como um devir-negro do mundo o processo que estamos vivendo, ou seja, mais pessoas estarão enquadradas naquele signo de exclusão e ressignificação opressora por que historicamente passam as populações “negras”, povos considerados inferiores estão sendo exterminados e demonizados pela mídia ocidental e seus seguidores na formação do imaginário da maioria populacional mundial sem acesso a formas diversificadas de informação, ficando restritos ao que é oferecido pela indústria hegemônica para o consumo diário.
Desde os grupos rebeldes opositores sírios, passando pelos povos do Magrebe em conflito estimulado pelo ocidente para o controle do Petróleo, caso do Sudão e da Líbia, chegando ao continente americano, nos EUA com o assassínio de jovens negros e hispanos, à guerra entre os cartéis de drogas mexicanos e, com isso a expulsão de grande número de grupos originários de suas terras tradicionais, à situação da Colombia e as populações afrodescendentes e indígenas vitimas da “Guerra às drogas”, chegando ao Brasil, país com o maior número de jovens negros mortos no mundo, superando até mesmo países com conflitos bélicos, existe um interesse geopolítico que permite um maior ou menor número de barbaridades cometidas contra esses grupos de Maiorias Minorizadas, interesse esse mediado pela potência unipolar que é o EUA e sua indústria cultural que constrói e/ou destrói subsistemas dependentes e associados aos seus interesses. E por que é importante associar este processo político do sistema mundo atual com o bem viver das populações negras e indígenas no Brasil de hoje? Simples, ou quase simples, é esse sistema que permite e secunda nossas vulnerabilidades sociais: é esse sistema atrelado aos interesses hegemônicos que manipula o sistema político nacional, permite o golpe e secunda a atuação das forças do Estado no aniquilamento da população negra, no não oferecimento de um sistema educacional que atenda à todos, veja o projeto da PEC 55, ou que ignora a situação das mulheres negras quando buscam acesso aos serviços públicos de saúde. Por fim, esse sistema político, supostamente invisível, é que articula a construção do imaginário popular através de seus sistemas comunicacionais, e objetifíca o ser humano negro em suas demandas diárias. O sistema de comunicação que hoje usufruímos e que nos faz vitima, é o que contribui para a naturalização dos corpos negros espancados e pendurados nos postes do Brasil, quiçá das Américas, e nos faz vitimas e algozes de nós mesmos.
Enfim, retomando o pensador camaronês Achille Mbembe, citado no inicio deste texto, em seu livro seminal “Critica da Razão Negra, dirá que o capitalismo do século XXI tem profundas raízes no que ele chama de primeira fase do capitalismo europeu iniciado no século XV, e, que, para se justificar, justificar a exploração estruturada do homem pelo homem, se aproveitou da luta de raças, que viria antes mesmo da luta de classes, para a opressão de uns muitos  e o domínio de poucos, e que isso se daria a partir do avanços das técnicas. Dirá ele que, hoje em dia, com os novos meios comunicacionais, o neoliberalismo, ode ao consumo e exclusão de muitos para o benéfico de uns poucos, estamos vivendo um devir-negro do mundo.
Ao observar o alto número de desempregados, trabalhadores precarizados, mulheres negras que, por serem negras, recebem menos atenção e anestesia nos hospitais públicos, aumento das denuncias de racismo e preconceito, impedimento do acesso de alguns a serviços que era para todos, e repito: o alto número de morte da juventude negra no Brasil, não concordaremos com Mbembe que estamos retornando, de modo novo, a um período cunhado como de “trevas”?
Destarte, acredito que só a organização político-social comunitária, esforço para superação dos obstáculos pessoais, com muita luta e obstinação, e visão crítica do mundo, capacitação para a luta diária, mas, também, intelectual, que permita a intervenção comunal ou individual nos espaços de poder constituídos, nos permitirá sobreviver e ultrapassar o destino que teimam em nos determinar.
Richard Santos, também conhecido como Big Richard, é doutorando em Ciências Sociais no CEPPAC-UNB, mestre em comunicação pela Universidade Católica de Brasília, especialista em História e Cultura no Brasil pela Universidade Gama-Filho e graduado em Ciências Sociais pela Universidade Metodista de São Paulo. Membro da Intercom, Sociedade brasileira de estudos interdisciplinares da comunicação, Membro do Observatório Latino-americano da Indústria de Conteúdos Digitais na Universidade Católica de Brasília, diretor da Nação Hip Hop Brasil e presidente da Associação de pós-graduandos da UNB, APG-UNB.
 
 
 
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