São Paulo, 16 de maio de 2023
A Associação Nacional de Pós-Graduandos (ANPG), primeiramente, manifesta solidariedade a todo povo gaúcho, atingido pela catástrofe climática que, desde 27 de abril de 2024, aflige mais de 2 milhões de pessoas.
O cenário se torna mais grave e desolador quando observamos as incertezas sobre os impactos de longo prazo nas vidas de milhões de pessoas: a cada dia aumentam os números de mortos, feridos, desalojados e desalentados, bem como o rastro de destruição da infraestrutura das cidades. Com incontáveis problemas atuais e os que virão, são previsíveis a possibilidade de aprofundamento das desigualdades socioeconômicas e até mesmo a migração de refugiados climáticos para outros estados.
Por isso, acreditamos que a reconstrução do Rio Grande do Sul passa pela centralidade do investimento em Ciência.
A partir dessa compreensão, a ANPG prontamente demandou à CAPES, ao CNPq e à FAPERGS, principais agências de fomento de bolsas de estudo para pós-graduação no estado, a prorrogação de vigência das bolsas de estudos, de prazos de integralização do curso e da cobrança da defesa da dissertação ou tese durante o período da calamidade pública do estado do RS.
Consideramos que essa movimentação inicial foi de suma importância e abriu caminho para que as agências de fomento pautassem suas ações emergenciais, como a prorrogação da vigência das bolsas ativas da CAPES por até 2 meses. Entretanto, precisamos ampliar o número de bolsas para que a ampliação não prejudique os pós-graduandos que esperam por uma cota de vagas. Ainda é necessário também que a prorrogação das bolsas CAPES, e do mesmo modo para as bolsas CNPq e FAPERGS, seja garantida no tempo que for necessário para a retomada das atividades em sua normalidade.
Acreditamos que esse é o caminho que o poder público deve trilhar: aquele que valoriza e escuta os cientistas e que constrói políticas públicas a partir dos resultados científicos produzidos por pesquisadores e pós-graduandos nas IES brasileiras. Diversas iniciativas emergenciais têm sido apresentadas pelo Governo Federal, entre elas o projeto que suspende os pagamentos de 36 parcelas mensais da dívida do Rio Grande do Sul com a União para que o dinheiro seja aplicado em ações de enfrentamento à situação de calamidade pública provocada pelas chuvas. Esse projeto visa beneficiar não apenas este estado, mas todo ente federativo em estado de calamidade pública futuro decorrente de eventos climáticos extremos.
Consideramos esse um importante marco legislativo e político para o trabalho de reconstrução de cidades afetadas direta e indiretamente pelas tragédias em decorrência das mudanças climáticas.
No caso do RS, o estado teria à disposição para as ações de reconstrução cerca de R$ 11 bilhões (soma do superávit orçamentário do estado dos últimos 3 anos). Considerando a possibilidade de queda na arrecadação do estado pela impossibilidade de funcionamento da indústria e do comércio em várias regiões e que o fundo do estado para reconstrução necessita destes recursos financeiros, é urgente a construção de soluções baseadas nas pesquisas científicas e uso de inovações tecnológicas para estes setores, de modo que os trabalhadores não sejam sobrecarregados e suas hipossuficiências sejam desconsideradas.
Contudo, reconstruir a economia a partir da Ciência e da Tecnologia é apenas uma das prioridades. Para nós também deve ser prioritário, com contribuições diretas dos grupos de pesquisa das IES do RS, o aprimoramento do Sistema de Assistência Social, a reconstrução de escolas, universidades, hospitais, postos de saúde, espaços de cultura e lazer em tempo recorde, como estudos para definição de localidades seguras para novas habitações, sistemas que auxiliem na distribuição de doações para a população em situação de vulnerabilidade, obras para prevenção de deslizamentos e de enchentes, a retomada da cidade de Porto Alegre não apenas como a capital mais arborizada, mas a primeira cidade esponja do Brasil, entre outras propostas.
O Rio Grande do Sul conta com 37 IES com pós-graduação stricto sensu, sendo o estado com a maior concentração de Universidades Comunitárias e com a 3ª maior pós-graduação stricto sensu do país – na UFRGS. Compreendendo que são nestes locais que se produz a maioria das pesquisas científicas e que os pós-graduandos são aqueles que estão diretamente responsáveis por essa produção, é relevante que o Ministério da Educação, junto à Secretaria de Ensino Superior, à CAPES, à Comissão Nacional de Residências Multiprofissionais em Saúde e à Comissão Nacional de Residências Médias, e que o Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação, junto ao CNPq e à FINEP, formulem e apresentem ações que garantam recursos para infraestrutura das IES e suas pós-graduações e para a formação dos recursos humanos da pós-graduação do RS.
Logo, para que seja possível a reconstrução do Rio Grande Sul socialmente referenciada, defendemos a criação do Plano Emergencial da Ciência Gaúcha, que conte com as seguintes ações:
- Criação de Conselho Científico de Reconstrução do RS, vinculado ao Ministério Extraordinário de Apoio à Reconstrução do RS, organizado a partir do MCTI, com a participação de pesquisadores e pós-graduandos das IES do RS para orientar as políticas públicas de reparação e reconstrução ordenada, segura, sustentável e focadas nas pessoas;
- Viabilização de novos recursos para apoio financeiro aos grupos de pesquisa localizados no estado do RS e novas cotas de bolsas de estudos para pós-graduação, de modo que possam garantir que os trabalhos de pesquisa realizados pelos grupos não sejam perdidos devido à falta de infraestrutura necessária para sua manutenção;
- Criação de novas cotas de bolsas no Sistema de Controle de Bolsas e Auxílios no Programa de Demanda Social, no Programa de Suporte à Pós-Graduação de Instituições de Ensino Particulares e no Programa de Suporte à Pós-Graduação de Instituições Comunitárias de Educação Superior para mestrado e doutorado nas IES localizadas no Rio Grande do Sul, de modo a não ampliar o tempo de espera dos pós-graduados para obter a bolsa de estudos;
- Criação de políticas de auxílios financeiros para permanência de pós-graduandos do RS, combatendo a possibilidade de evasão e perda de futuros titulados;
- Disponibilização de recursos a fim de que as IES viabilizem a construção de uma estrutura para suporte emocional com psicólogos e assistentes sociais para pós-graduados e docentes;
- Análise, através da DAV junto ao CTC/CAPES e às coordenações de área, da aplicação dos critérios do sistema de avaliação dos programas de pós-graduação do estado do RS, considerando os impactos da catástrofe na produção científica estadual;
- Reativação dos contratos de bolsas de estudos encerrados no mês de maio deste ano, garantindo automaticamente a prorrogação do tempo de vigência previsto na portaria nº 142/2024;
- Dispensa da obrigação de defesa da dissertação ou tese para os pós-graduandos bolsistas do estado do RS com vigência ativa em maio de 2024 – mês da ocorrência das enchentes – e nos meses subsequentes em que perdurarem condições de calamidade pública pelas autoridades locais;
- Prorrogação do prazo de defesa para pós-graduandos detentores de contratos de bolsas CAPES, CNPq e FAPERGS com vigência ativa em maio de 2024 – mês da ocorrência das enchentes – e nos meses subsequentes em que perdurarem condições de calamidade pública pelas autoridades locais;
- Orientação aos Programas de Pós-Graduação acerca da possibilidade de prorrogação por até 2 (dois) anos dos prazos para as dissertações, teses e demais trabalhos de conclusão de curso, em observância ao artigo 18 da Resolução nº 03/2024 CNE/CP;
- Abono de falta nas atividades teóricas e práticas para os residentes em saúde do RS;
- Atenção à saúde mental dos residentes em saúde, bem como dos demais atores presentes no dia a dia das Residências em Saúde no estado do RS, com envio de um protocolo de atenção à saúde com esta temática;
- Prorrogação da vigência dos contratos de bolsas de residência em saúde pertencentes aos Ministérios da Educação, da Saúde e Governo do Estado.
Além dessas ações, consideramos importante que as IES gaúchas se comprometam com as seguintes ações:
- A suspensão das atividades acadêmicas e dos prazos administrativos para a pós-graduação da IES, caso ainda não tenha sido, e/ou a sua manutenção até que sobrevenha novo calendário acadêmico para pós-graduação;
- A construção de um novo calendário letivo, que seja reorganizado com ampla participação da comunidade acadêmica, sobretudo dos pós-graduandos e de sua representação, e que nesta reorganização sejam estabelecidos os prazos para retorno gradual para atividades com presença física dos pós-graduandos e os períodos para a garantia da recuperação física e mental dos pós-graduandos;
- A garantia da não obrigatoriedade de realização de provas e de flexibilização dos prazos de entrega de trabalhos científico-acadêmicos em caráter de avaliação formativa durante o período de calamidade pública e no processo de retorno gradual às atividades presenciais, quando permitidas pelas autoridades locais;
- A garantia de prorrogação de prazos de integralização de curso para todos os pós-graduandos não-bolsistas que solicitarem, e a garantia de prorrogação de prazos de integralização de curso e da vigência de bolsas para bolsistas CAPES, conforme a portaria CAPES/MEC nº 142/2024, bem como a de outras prorrogações que sobrevierem a ser disponibilizadas pela CAPES e pelos demais órgãos de fomento;
- A busca ativa junto aos pós-graduandos para saber suas condições estruturais e emocionais para cumprimento da carga horária de atividades pedagógicas por meio remoto, com uso de plataformas de reuniões virtuais, e garantia de que não haja prejuízo daqueles pós-graduandos que não tiverem condições de exercer as atividades neste formato;
- Vedação da realização de atividades acadêmicas por meio remoto enquanto perdurar o período de suspensão do calendário acadêmico e até que sobrevenha novo calendário letivo.
Essas são algumas ações emergenciais sistematizadas pela ANPG e enviadas por ofício aos órgãos competentes. Defendemos que essas ações componham um Plano Emergencial à Ciência Gaúcha para a Ciência e a Tecnologia cumprir o seu papel no projeto de suporte integral ao povo gaúcho, a fim de reconstruir o estado do Rio Grande do Sul e recolocá-lo como parte de um projeto de desenvolvimento nacional comprometido com o enfrentamento às desigualdades de todas as ordens e em prol da justiça climática, garantindo direitos para os pós-graduandos do RS e valorizando cientistas e pesquisadores do RS.
Teto, Pão, Justiça Climática, Reconstrução! Todos Juntos Pelo RS!
Diretoria Plena da ANPG