24º CNPG: Painel “Assédio Moral” debate as dificuldades na relação dos pós-graduandos com seus orientadores

carteira de estudante

CNPG Assédio Moral

Assédio moral praticado pelo orientador ao pós-graduando é uma prática institucional, em maior ou menor grau, mas institucional. Essa opinião foi consenso entre os pesquisadores que participaram do painel sobre “Assédio Moral e outros abusos na relação acadêmica”, na sexta-feira (02), segundo dia do 24º Congresso Nacional de Pós-Graduandos.

Para o debate foram convidados o diretor da Comissão de Integridade do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Guilherme Melo, e o representante discente da Universidade de São Paulo (USP), doutorando em Biociências e Coordenador geral da APG IQ USP, Philipe Santana.

“Assédio é crime e por isso deve ser denunciado. Esse é um problema da área de direito, de administração e de psicologia”, afirmou Guilherme. O professor também ressaltou o bom exemplo dos EUA, onde, de acordo com ele, os professores tem o cuidado de nunca se reunirem com estudantes sozinhos a portas fechadas.

Para Philipe, a pauta de direitos dos pós-graduandos é muito pertinente a este assunto. “O tema assédio ainda não é muito elaborado. Mas espero que esse 24º CNPG seja ponto de partida para ampliar esse debate”. De acordo com ele, devido à falta de legislação não existem “regras claras” nas relações e por isso benefícios como férias, por exemplo, precisam ser negociadas, o que é uma porta de entrada para abusos. “O assédio é melhor caracterizado no campo formal. A situação do pós-graduando de híbrido estudante/trabalhador não simplifica as condições de trabalho. Conseguir assegurar um arcabouço de direitos é essencial para evitar o assédio”, explicou.

Para o representante discente as relações científicas não deveriam ser construídas em uma relação hierárquica, mas sim em uma relação de troca. Ele sugeriu ainda uma avaliação dos dados de evasão e adoecimento entre os pesquisadores para a partir destes indicadores serem encaminhadas ações “que não parem nos órgão colegiados”.

A doutoranda da USP, Fernanda Marques, lembrou que toda instituição possui, por lei, uma Comissão de Ética. “O ideal seria ser uma comissão paritária na qual os estudantes sejam melhor representados”, destacou.

Já a pós-graduanda Lúcia Guerra, também da USP, compartilhou com os presentes a experiência de seu amigo da graduação, que foi estudar no Canadá pelo programa Ciência sem Fronteiras. Segundo ela, lá “os professores deixam muito claro, logo no início da pesquisa, o que vão exigir dos alunos”, e também o modo de tratamento dos docentes com estudantes sem esse resquício de autoritarismo que ela vê no Brasil. O diretor do CNPq concordou com a pós-graduanda, dizendo que a transparência entre as partes na questão de objetivos e expectativas deve ser acordada já no início do trabalho em conjunto.

O pós-graduando Pablo Valente, da Associação de Médicos Residentes do Instituto de Infectologia Emílio Ribas, lembrou que a falta de estrutura em institutos e universidades contribui que incidam sobre os pesquisadores tarefas que necessariamente não seriam deles ou o excesso de horas de trabalho, no caso dos médicos, facilitando abusos.

Casos e casos

O mestrando em desenvolvimento sustentável da Universidade Federal de Lavras (UFLA), Thiago Magalhaẽs Meireles se declarou vítima de assédio. Ele contou que abandonou o projeto de pesquisa e ficou durante um ano tendo pesadelos com o orientador. “Que tipo de professores estão sendo formados? Esses que foram oprimidos não vão acabar repetindo essa opressão?”, questionou.

Uma pesquisadora da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) que pediu para ter sua identidade preservada, veio ao 24ºCNPG “escondida” do orientador e pediu sugestões ao grupo de como se defender do assédio que sofre – o orientador ironiza sua participação política constantemente e pressiona pela quantidade de artigos que ela deve produzir – e também ajudar os colegas de universidade.

No final do painel os participantes concordaram que é necessário uma maior conscientização entre eles sobre seus direitos para que eles possam buscá-los. “ É um tipo de violência invisibilizada, a vítima não sabe que sofre um abuso e muitas vezes o agressor também não acha que está fazendo algo errado”, finalizou Philipe.

Por Cristiane Tada, do Rio de Janeiro