Aquífero Guarani poderá ser privatizado. É preciso resistir!

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Agência Brasil

Esta semana a Rede Brasil atual trouxe uma entrevista com o Geólogo Luiz Fernando Scheibe, professor emérito da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) que alerta que o Aquífero Guarani, área de 1,1 milhão de quilômetros quadrados que compreende as regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste do país e também parte de Argentina, Uruguai e Paraguai está no alvo do governo de Michel Temer. Segundo ele, a exemplo do pré-sal, também o aquífero poderá ser privatizado conforme a aprovação do Programa de Parcerias para Investimentos (PPI).
A relevância do Aquífero Guarani, um dos maiores mananciais mundial de água doce, é tamanha que tem sido alvo da especulação quanto ao seu uso e exploração. O Projeto de Proteção Ambiental e Desenvolvimento Sustentável do Sistema Aquífero Guarani, conhecido por Projeto Aquífero Guarani (SAG), da Agência Nacional das Águas (ANA), foi criado com o propósito de apoiar Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai na elaboração e implementação de um marco legal e técnico de gerenciamento e preservação do Aquífero Guarani para as gerações presentes e futuras. Após a vitória dos conservadores na Argentina e o golpe brasileiro, restou ao Uruguai votar contra a privatização do aquífero.
Confira parte da entrevista feita pelo jornalista Helder Lima com o professor Scheibe :
O sr. diria que o Aquífero Guarani está em processo de privatização?
Nossa preocupação maior é com os aquíferos Guarani e Serra Geral – este último é um aquífero que está sobre o Guarani. O acesso à água é considerado direito fundamental de todos os seres humanos. Falar em privatização de qualquer fonte de água é algo que foge ao conceito de direito humano fundamental da água. Quanto à privatização de uma determinada fonte de água, não existe normalmente uma privatização, mas uma possibilidade de outorga, que é uma concessão feita pelo Estado. O Aquífero Guarani tem 1,1 milhão de quilômetros quadrados. Falar na privatização do aquífero é como falar na privatização de uma área que em praticamente um oitavo da área do Brasil. Não seria algo viável.
O acesso a essa água deve ser sempre público e não pode ser privatizado. A água não deve ser concedida de jeito nenhum, ainda que exista a possibilidade de outorga para determinados usos, desde que eles não comprometam o acesso das outras pessoas. No caso do Aquífero Guarani, por causa da extensão, o grande problema é o uso localizado do aquífero. Vamos tomar como exemplo a cidade de Ribeirão Preto, no interior de São Paulo. Essa cidade está localizada sobre uma área de afloramento do aquífero e uma parte da área tem cobertura pelo outro sistema aquífero, que é o Serra Geral. Em Ribeirão, estão fazendo uso tão intenso que, ao cabo de 50 anos de exploração, o nível da água dentro do aquífero já baixou mais de 60 metros, o que significa que a reserva disponível está diminuindo drasticamente.
 
Também é importante a gente ter clareza do que é o aquífero­ – uma rocha que contém água nos seus poros ou em suas fraturas. Não se trata de um corpo de água, mas de um corpo de rocha que contém água. E o movimento da água dentro do aquífero é extremamente lento. Enquanto em um rio a água se movimenta em metros por segundo, dentro do aquífero a água se movimenta em velocidade de metros por ano. O que acontece em uma determinada parte do aquífero tem uma abrangência local. O fato de em Ribeirão Preto estarem praticamente esgotando as possibilidades de exploração não quer dizer que o restante da reserva esteja sendo ameaçado.
É a maior reserva de água subterrânea do mundo?
Uma das maiores do mundo. Sua importância está mais ligada com o fato de que ela ocorre em uma área que é a mais habitada e industrializada da América do Sul. Só para exemplificar: na Amazônia tem um aquífero maior, Alter do Chão, que é quatro vezes maior, mas ele está em baixo do rio Amazonas e no meio da floresta. Então, não é um local em que essa água tem uma importância geopolítica, digamos assim. Embora não seja a maior reserva do mundo, 60% do PIB dos quatro países estão na área de ocorrência do Aquífero Guarani.
O Senado aprovou medida provisória que autoriza o chamado PPI, um dos tentáculos do governo Temer. Essa medida, que amplia possibilidades de privatizações e concessões, chega a preocupar no que se refere ao aquífero?
Olha, essa medida preocupa demais com relação a muitas outras questões e também em relação ao aquífero, porque antes de tudo é um patrimônio do povo dos quatro países em que ele ocorre. O fato de que você vai fazer concessões no longo prazo, especialmente para empresas estrangeiras, eventualmente limitando o acesso das populações a essa riqueza, é extremamente preocupante, porque se está concedendo um direito que é da população. A privatização ou outorga que limite o acesso de outras pessoas ou mesmo de empresas a esse recurso é extremamente preocupante. Como preocupa muito que o Estado brasileiro esteja concedendo a empresas estrangeiras, mesmo estatais de outros países, o acesso ao petróleo, ao pré-sal. A negociação feita pelo governo e pela Petrobras sobre a área de Carcará (em Santos, litoral paulista) é um exemplo disso. Um patrimônio que pode ser estimado em pelo menos US$ 60 bilhões foi entregue a uma empresa estatal norueguesa por US$ 2 bilhões. Temos de ficar muito preocupados.
Existem mais ameaças rondando o aquífero Guarani?
Tem as ameaças do uso abusivo de fertilizantes químicos e de agrotóxicos nas áreas de ocorrência desses aquíferos. No caso do Guarani, sua maior parte não está à flor da terra, mas embaixo de outros aquíferos, no caso o Serra Geral, e no noroeste do Paraná e parte de São Paulo tem outro aquífero muito importante, que é o Bauru. Todos estão sujeitos ao uso dessa quantidade imensa, não só dos agrotóxicos, dos quais o Brasil é campeão mundial de utilização, mas dos próprios adubos e fertilizantes químicos. Esses produtos têm muitos elementos que são prejudiciais à saúde. O uso intenso de fertilizantes e agrotóxicos, consequência direta do domínio exercido pela Monsanto, que agora foi comprada pela Bayern, esse domínio obrigando praticamente o produtor a usar sementes transgênicas, que por seu lado obrigam o uso do glifosato, que se revelou cancerígeno. Enfim, esse é um modelo que afeta as nossas águas superficiais e provavelmente dentro de algum tempo, já que subterraneamente o movimento é lento, afetará as nossas águas subterrâneas. Esse é outro problema extremamente grave.
Para ler a matéria da integra: http://www.brasil247.com/pt/247/brasil/260571/Temer-abre-espa%C3%A7o-para-entregar-aqu%C3%ADfero-Guarani.htm