As universidades públicas paulistas à beira do colapso

carteira de estudante

*Por Fabricio Godoi

Dia 30/06/2015 houve a votação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para o ano de 2016, na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (ALESP). O que se viu foi uma desproporção imensa: 15 votos contrários à proposta e 61 votos favoráveis, dos 94 parlamentares da casa.

A proposta foi construída pelo Governo do Estado e inicialmente determinava que o financiamento das universidade públicas paulistas seria garantido com no máximo 9,57% da arrecadação do ICMS, após os descontos legais. Uma proposta descabida, já que permitiria ao governo destinar qualquer parcela para as universidades, ou mesmo zerar os repasses.

O Fórum das Seis (as entidades sindicais de professores e técnicos das universidades), juntamente às entidades estudantis, promoveram grande pressão para que se corrigisse o texto encaminhado à ALESP. Essa pressão surtiu efeito e o projeto foi encaminhado sem a expressão “no máximo”.

Desde 1995 as LDOs determinam 9,57% desta arrecadação. Esse repasse de recursos se mantém proporcionalmente inalterado desde aquele ano, quando as universidades ofereciam muito menos vagas, menos programas de pós-graduação e tinham menos campi. Apenas a título de exemplo, lembramos que a USP incorporou a antiga Faenquil, que tornou-se a Escola de Engenharia de Lorena – e tem dois campi, além de inaugurar a USP Leste na capital paulista; a Unicamp inaugurou o campus Limeira e a Unesp prossegue com o seu vigoroso programa de expansão. Em contrapartida dessa expansão o governador Alckmin prometeu às universidades maiores alíquotas. Para o campus Limeira, por exemplo, o governador concederia um adicional de 0,05% da arrecadação para a Unicamp. As promessas nunca foram cumpridas.

O Fórum das Seis e as entidades estudantis defendem a pauta histórica de comprometimento de 11,6% da arrecadação integral do ICMS para o financiamento das universidades públicas paulistas. Defendemos também a aplicação de 33% da receita dos impostos à manutenção e ampliação do nível de qualidade nos quatro níveis: infantil, fundamental, médio e superior e a destinação de 3,3% do ICMS integral para o Ceeteps.

Essas pautas, que são defendidas há anos por essas entidades, tornam-se ainda mais importantes nesse ano, em contexto de crise. As universidades públicas paulistas atualmente ou gastam mais do que arrecadam ou se aproximam desse estágio. A arrecadação de impostos está caindo no exercício atual e a tendência é que as reservas financeiras das universidades venham a se esgotar em alguns poucos anos. A partir desse momento, as universidades não poderiam honrar seus compromissos financeiros, incluindo o pagamento de salários. Obviamente, seria o colapso do sistema universitário público paulista.

É importante frisar que as reitorias estão lidando com essa crise da maneira mais conservadora possível: demitindo (por meio de programas de demissão voluntária), não repondo postos de trabalho de aposentados, oferecendo reposições salariais abaixo da inflação, cortando gastos em todas as áreas, desvinculando serviços e extensão, etc. Não é possível garantir-se qualidade em meio a tal processo de desmonte.

No entanto, pela primeira vez em muito tempo, todas as categorias estiveram do mesmo lado que as reitorias, durante o processo de discussão e votação da LDO 2016. Os reitores, mais conservadores, pleiteavam o aumento da alíquota de 9,57% para 9,907%. Na reta final o reitor da USP capitulou e não compareceu. Mas a ALESP, cuja composição é ainda mais retrógrada que o Congresso Nacional, não atendeu aos desígnios do povo. Apesar da presença do movimento estudantil e do movimento sindical, da pressão popular junto aos deputados e nas redes sociais, o resultado foi o descrito no início desse texto. Uma derrota do povo.

Os estudantes não vão se desmobilizar. Nós, pós-graduandos, vamos continuar na luta por uma universidade pública, gratuita, de qualidade, democrática e popular. E isso passa diretamente pela importância do financiamento público, com valores correspondentes à importância do ensino superior e da pesquisa na sociedade brasileira e paulista.

A manutenção da alíquota em 9,57%, em primeiro lugar, manterá o sentido das universidades rumo ao desmonte ou ao colapso. A continuidade dos ajustes feitos pelas reitorias levará inevitavelmente ao desmonte, já que não será possível oferecer os mesmos serviços com menos pessoal e materiais. A manutenção das instalações também tende a se precarizar. Os mais promissores professores e funcionários tendem a procurar outras instituições, que ofereçam melhores condições de trabalho.

Em segundo lugar, a manutenção da alíquota não permitirá a expansão da oferta de vagas públicas. A universidade pública paulista nasceu como uma ferramenta para as elites locais reproduzirem sua cultura e seu poder e até hoje há ranços dessa ideologia. A expansão e a democratização do acesso, com a contínua progressão das cotas, são a garantia que o investimento estatal seja revertido enfaticamente a favor do povo.

Em terceiro lugar, a manutenção da alíquota ensejará o maior ingresso de verbas não-públicas na universidade. O que aparentemente é algo positivo – já que abateria as despesas – é algo que abre precedentes perigosos, já que esse tipo de financiamento prevê um retorno específico. As funções da universidade não podem ser delimitadas por investidores que visam apenas benefícios próprios. Essas funções devem estar fortemente embasadas no interesse público e somente a ele.

Nós, da APG USP São Carlos e do coletivo Amanhã Vai Ser Maior na ANPG, estivemos presentes na ALESP. Perdemos uma batalha, mas continuaremos lutando pelas pautas históricas (11,6% do ICMS integral para as universidades públicas paulistas) e também pelo projeto de uma universidade pública não apenas gratuita e de qualidade, mas também democrática e popular.

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