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Wanderley de Souza é professor titular da UFRJ e membro da Academia Brasileira de Ciências e da Academia Nacional de Medicina. Artigo publicado no Jornal do Brasil de sexta-feira (11).
Há muitos anos, todos os chefes de Estado e de governo incorporaram em seus discursos a priorização das áreas de educação, ciência e tecnologia como absolutamente essenciais para assegurar o progresso econômico e social de forma sustentada. Pelos motivos os mais variados, na maioria das vezes, o discurso não veio acompanhado de decisões traduzidas em efetivo aumento orçamentário para estes setores.
Em recente livro intitulado Sobre a China, lançado no Brasil pela editora Objetiva em 2011, Henry Kissinger nos traz alguns documentos e transcrições de discursos e conversas com autoridades da China, que merecem ser mais divulgados. Em relação ao tema do nosso interesse, merece destaque o discurso de Deng Xiaoping, sucessor de Mao e grande arquiteto do processo de desenvolvimento da China. Afirmou ele: "A chave para conquistar a modernização é o desenvolvimento da ciência e da tecnologia. E, a menos que prestemos especial atenção na educação, será impossível desenvolver a ciência e a tecnologia. Palavras vazias não levarão nosso programa de modernização a lugar algum; devemos ter conhecimento e pessoal treinado".
Efetivamente, Deng e seus sucessores (Jiang Zemin e Hu Jintao) investiram significativamente nas áreas de educação, ciência e tecnologia, fazendo com que a China, em relativamente pouco tempo, passasse por uma transformação significativa nestas áreas, com forte impacto no desenvolvimento econômico e social. Em pouco tempo percebemos o aumento considerável de jovens pesquisadores chineses nos melhores laboratórios de pesquisa dos Estados Unidos e da Europa. Logo em seguida, as revistas científicas passaram a publicar, com frequência crescente, artigos científicos de excelente qualidade provenientes de laboratórios da China.
Revistas editadas na China passaram a ter elevado impacto. Cito como exemplo, a revista Cell Research fundada em 1990 pelo Shangai Institute of Cell Biology e que já conta com um fator de impacto de 9.4. A título de exemplo, a revista brasileira de maior prestígio (Memórias do Instituto Oswaldo Cruz) foi fundada em 1909 e tem um fator de impacto de 2.0. Gradualmente, o número de artigos publicados em revistas internacionais provenientes da China foi aumentando e em 2009 alcançou o elevado número de 118.108 artigos publicados, passando o país a ocupar a segunda posição mundial, conseguindo ultrapassar países de grande tradição científica como a Alemanha, Inglaterra, França e Japão.
Por outro lado, a Universidade de Pequim já aparece entre as cinquenta melhores universidades do mundo no ranking elaborado pela Times Higher Education em 2011, ocupando a 49ª posição (neste ranking a melhor universidade brasileira é a USP, que ocupa a 178ª posição). O exemplo chinês mostra como em apenas uma geração é possível transformar um país tendo como alicerce básico o investimento em educação, ciência e tecnologia.
A China segue os passos do Japão e da Coreia. Os resultados são tão evidentes que nos surpreende o fato de o Brasil ainda seguir engatinhando nesta área, com idas e vindas. No período 2003 a 2010 tivemos aumentos crescentes de orçamento na área de C&T, mas os orçamentos de 2011 e 2012 sofreram cortes significativos, que estão deixando perplexa toda a comunidade acadêmica brasileira.