Presidenta da UBES fala sobre violência escolar em artigo

carteira de estudante
Manuela Braga, presidenta da União Brasileira dos Estudantes Secundaristas, escreveu um artigo intitulado “A verdadeira face da violência escolar”, no qual analisa diferentes níveis de conflitos entre alunos e professores. Braga explica que a violência está diretamente relacionada ao uso de armas e drogas e enfatiza que a falta de identidade dos alunos, professores e diretores com a escola pode fomentar essa violência. Leia abaixo o artigo completo.   
 
"A verdadeira face da violência escolar 
 
Por Manuela Braga 
 
Nos Estados Unidos o termo usado em diversas pesquisas é “delinquencia juvenil”, na Inglaterra é definido por alguns atores apenas no caso de conflitos entre estudantes e professores ou medidas disciplinares como suspensão. No Brasil, ainda não temos um conceito definido como consenso para a violência escolar. 
 
O especialista Bernard Charlot, professor de Ciências da Educação da Universidade de Paris 8, classifica violência escolar em três níveis: violência (golpes, roubos, crimes, vandalismo e sexual), incivilidades (humilhação, falta de respeito) e simbólica ou institucional (desprazer do ensino por parte dos estudantes e negação da identidade e da satisfação profissional por parte do professor). 
 
O fenômeno da violência nas escolas, já reconhecido e pesquisado desde a década de 50, vem ganhando graves proporções. Relacionado diretamente com a disseminação do uso de drogas e armas, hoje se tem como fator agravante a distância cada vez maior entre escola e comunidade, mas também devemos considerar fenômenos como a globalização nos moldes de uma sociedade em que apresenta uma completa inversão de valores e a exclusão social. 
 
Outro fator determinante é a falta de identidade com a escola, não só pelos estudantes, mas também pelos profissionais em educação, se tornando uma violência de cunho institucional, onde se fundamenta um sistema de normas e regras autoritário: as regras de convivência, o projeto político-pedagógico, os recursos didáticos e a qualidade da educação.
 
 O conteúdo não lida com temas básicos que são vividos pelos jovens, ignora a realidade da juventude e o professor pouco consegue flexibilizar o conteúdo e o formato das aulas, não tendo – na grande maioria das vezes – acesso nenhum a ferramentas básicas como laboratórios, quadras e bibliotecas que contribuam para repassar o conteúdo. 
 
Enfrentamos salas de aulas abarrotadas, professores desvalorizados que não conseguem sequer preparar a aula por serem obrigados a lecionar em mais de uma escola, para com isso, poder ter as despesas custeadas pela profissão que escolheu. Em pleno 2013, a principal ferramenta – ou a única para transmitir o conteúdo – é o quadro de giz, em tempos onde faz parte do nosso dia equipamentos de alta tecnologia, temos um hiato ascendente entre o que se passa dentro e fora da escola.
 
As regras de convívio não necessariamente correspondem as expectativas e demandas do século XXI. Onde está expresso, por exemplo, que para entrar na sala de aula o estudante deve tirar o boné, que todos devem usar roupas iguais, nas cores e modelos definidos pelo sistema de ensino? Não estou dizendo com isso que se deve permitir que quem queira entre de boné na aula, muito menos que não se deve usar o fardamento, mas porque essas medidas não são discutidas com toda a comunidade? A verdade, é que nós jovens, somos em todos os sentidos obrigados a vestir um personagem para entrar na escola. 
 
O ambiente escolar que deveria ser um espaço para compartilhar conhecimentos, vivenciar boas experiências, debate, diálogo, se tornou um ambiente cada vez mais defasado, sem papel definido e desestimulante tanto para estudantes, quanto para professores.
 
Esse sistema coloca estudantes e professores em lados opostos, como verdadeiros inimigos, o que não é verdade, ambos são vítimas de um sistema educacional defasado. 
 
Recentemente a Apeoesp divulgou uma pesquisa onde mostra dados reveladores sobre a violências nas escolas. A mesma pesquisa onde mostra que os estudantes são os principais agressores também mostra que eles são as principais vítimas e que as escolas que fazem algum tipo de campanha e traz essa discussão para a comunidade tem menores índices de casos de violência. As experiências nos mostram o caminho a seguir. 
 
Está longe de fazer parte do conjunto de soluções para educação o policiamento e câmeras que cada vez mais vem fazendo parte do nosso cotidiano, uma violência não apenas contra os estudantes, mas também contra os professores. A mesma pesquisa também mostra que apenas 5% dos professores acreditam que o policiamento é eficaz no combate e que escolas que realizam campanhas têm menor índice de violência. O caminho é o inverso do que se vem trilhando para o combate a violência nas escolas. 
 
A escola tem um papel estratégico na garantia de direitos e qualidade da educação, deve ser entendida na perspectiva não apenas de transmitir o conhecimento, mas também de defender os direitos dos que a ela tem acesso. 
 
Embora tenhamos fatores externos atenuantes e que influenciam no comportamento do jovem no ambiente escolar, podemos encontrar soluções eficazes trabalhadas em conjunto com professores, estudantes, servidores e comunidade. Claro, não podemos apresentar uma receita de onde se vai ter resultado eficaz em todas as escolas, mas nas escolas onde possuem grêmios, conselhos escolares e gestão interativa com a comunidade têm-se no geral, resultados impactantes no combate a violência, aprendizado do conteúdo e professores mais valorizados e satisfeitos. 
 
Construir uma educação transformadora, libertadora e emancipadora, é uma luta que deve ser travada por toda a sociedade, aqui não há dúvidas de que estudantes e professores marcham no mesmo caminho.