O descontentamento gerado pela proposta da reitoria de transferir a administração do Hospital Universitário da USP ao governo do Estado culminou no Ato “O HU é nosso”, realizado ontem (26), em frente ao Conselho Universitário (CO), no Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT), onde seria decidido sobre a pauta da desvinculação do HU da USP. Estiveram presentes os representantes discentes (RDs) que defendem contra a desvinculação, juntamente com os dos funcionários.
O Sindicato dos Trabalhadores da USP (Sintusp) mobilizou um carro de som que foi utilizado para que ativistas de diferentes grupos pudessem expressar sua indignação quanto à desvinculação dos hospitais (Hospital Universitário -HU- e o Hospital de Reabilitação em Anomalias Craniofaciais -HRAC) e quanto à aprovação do Plano de Demissões Voluntárias sem diálogo com a comunidade e trabalhadores.
O Ato pressionou o CO a votar contra a desvinculação do HU. Muitos diretores de unidades e professores se posicionaram contra a desvinculação.
“O ato pacífico congregou diversas vozes dos movimentos sociais pela saúde e educação. A pressão exercida pela mobilização, ao menos, retardou os planos da reitoria, que deverá expandir os diálogos com a comunidade. A desvinculação do HU é ainda eminente e somente uma mobilização ainda maior e com uma maior apropriação da pauta será capaz de convencer o Conselho Universitário a ser contrário a esse projeto”, comentou Phillipe Pessoa, coordenador geral da APG IQ-USP e diretor da ANPG.
Após reunião, a reitoria aceitou retirar de pauta a desvinculação do HU, que será votada em 30 dias, e o plano de demissões voluntárias, adiado em 7 dias. O HRAC, no entanto, foi desvinculado da USP, sendo repassado à Secretaria Estadual de Saúde.
“O HU é um hospital escola e sua desvinculação ameaça as atividades de ensino, pesquisa e extensão. O governo do estado vem repassando responsabilidades da saúde pública para OSs (Organizações sociais de saúde). Essas medidas representam a privatização dos serviços de saúde com transferência de recursos públicos a instituições controladas pelo mercado. A desvinculação dos hospitais da USP reaviva esse debate, que deve intensificar-se a partir de agora”, acrescenta Phillipe.
Carta contra a desvinculação do HU – USP
Há menos de uma semana, seis dirigentes do Hospital Universitário da USP divulgaram carta em que criticam a proposta da reitoria. O diretor do departamento médico e chefes técnicos do hospital estão entre os signatários da carta. Eles afirmam que a formação dos estudantes da área da saúde da USP, que é feita em parte no hospital, poderá ser prejudicada.
A transferência foi proposta pelo reitor Marco Antonio Zago, como forma de aliviar a crise financeira que a universidade enfrenta.
O hospital consome entre 6% e 8% do orçamento da USP, dependendo da forma de cálculo. No local, são atendidos servidores da USP e moradores da zona oeste da capital paulista. A ideia da reitoria é transferir de imediato a gestão do hospital e os custos de manutenção.
Os funcionários da USP continuariam no local, mas, ao saírem, seriam substituídos por servidores contratados pelo governo estadual.
O reitor afirma que não haverá impacto na qualidade do ensino com a transferência e que a situação orçamentária da USP pode ser prejudicial ao atendimento no hospital.
Na carta, os dirigentes do hospital dizem que, com a transferência, o órgão “perderá autonomia na diretriz de ensino e correrá o risco de esse não ser mais o foco”, já que poderá ficar a mercê da política da Secretaria de Saúde, “que se depara com a falência do sistema público”.
Afirmam ainda que “será impossível manter excelência” após troca de equipes a preços de funcionários SUS.
“O Hospital Universitário, além de ser um hospital assistencial, é também um amplo campo de ensino para a graduação, pós-graduação e pesquisa. A população USP está em torno de 440.000 pessoas (dentre funcionários, docentes, alunos e dependentes) e a área metropolitana do Butantã são 500 mil habitantes. A ideia de economizar 300 milhões desvinculando o HU nos parece estranho, uma vez que a folha de pagamento continuará com a USP, mas com certeza o impacto na assistência (quem poderá e será atendido) será quase imediato e, no ensino e na pesquisa, ocorrera algum tempo após”, afirmou a Dra. Célia Maria Kira, médica do HU há 25 anos.
Segundo a carta enviada, o hospital recebe anualmente 2.430 alunos entre graduandos e pós-graduandos. Cerca de 40% do estágio hospitalar dos estudantes do curso de medicina é feito na unidade.
O reitor alega que, mesmo com a transferência, é possível fazer parcerias para que os estudantes atuem no local.
A medida precisa ser aprovada pelo Conselho Universitário, que se reúne na terça (26). Os dirigentes pedem que a proposta seja suspensa para ser mais discutida.
“Devido a problema pontual [a crise financeira] pode haver grande erro para a USP”, disse o diretor médico do hospital, José Pinhata.
A economia imediata para a USP com a transferência, diz ele, seria perto de R$ 70 milhões ao ano, num orçamento de R$ 5 bilhões, pois 80% dos gastos do hospital são com folha de pagamento.
Da redação com informações da Folha