O Seminário 20 anos de ciência, tecnologia e inovação em saúde no Brasil foi realizado nos dias 18 e 19 de setembro, na escola politécnica Joaquim Venâncio, sediada na Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro. Este evento foi promovido pela Associação Brasileira de Saúde coletiva (ABRASCO), Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Conselho Nacional de Saúde (CNS) e Comissão Intersetorial de Ciência e Tecnologia (CICT) do CNS. A proposta foi avaliar a trajetória construída até então e refletir sobre os rumos futuros. Nesta ocasião foi bastante discutida a proposta para a realização da 15ª Conferência Nacional de Saúde a ser realizada no próximo ano.
Dentre os temas abordados Ana Luiza Viana destaca os três momentos mais importantes quanto à perspectiva do complexo econômico industrial da saúde: a era do saneamento, era previdenciária e a era SUS. Ressaltou ainda que na era do saneamento foram construídos dois grandes laboratórios públicos, que até hoje são referência na pesquisa em saúde, são eles a Fiocruz (RJ) e o Instituto Butantã (SP). A visão de financiamento para o complexo industrial da saúde e o futuro da indústria farmacêutica também foram temas de discussão, tendo sido apresentados pelo então diretor do Departamento de produtos intermediários químicos e farmacêuticos (Defarma) do BNDES, Pedro Palmeira. Segundo Pedro, a indústria nacional era muito pouco baseada em inovação, cenário que vem se modificando, mostrando que as farmacêuticas nacionais acordaram para a inovação.
Carlos Gadelha, atual secretário de ciência e tecnologia do ministério, destaca que a pesquisa em saúde no país teve um acréscimo, porém, ainda pode-se considerar que podemos crescer muito mais. Mais um fato a ser observado é que a saúde dentre todos os setores tem avançado nas discussões de políticas de acesso e pontuou a preocupação de que no CNS é importante que haja uma comissão que discuta ciência e tecnologia em saúde. Vale ressaltar que esta comissão já existe e é denominada Comissão Intersetorial de Ciência e Tecnologia em Saúde (CICT). A mesma está trabalhando há pouco tempo e, talvez por isso tenha sido pouco divulgada e poucos a conheçam. Alguns membros da CICT estavam presentes no seminário: Luis Eugênio (ABRASCO – coordenador da comissão), Cristiane Quental (ABRASCO), Fernando Cupertino (CONASS) e Lenilton Silveira (ANPG).
Ainda no seminário a presidenta do CNS, Maria do socorro, apresentou algumas propostas para discussão na 15ª conferência Nacional de Saúde, cujo tema pode vir a ser “SUS público para cuidar bem das pessoas: um direito do povo brasileiro”. É preciso discutir o direito à saúde e a participação social, a estrutura do trabalho em saúde, como podemos ampliar e defender o SUS público, de qualidade e para todos e de que forma esta conferência pode vir a propor e afirmar diretrizes, planejando e intervindo no orçamento público da saúde. É importante que os ambientes virtuais possam ampliar a participação social e que as entidades que compõem o conselho (juventude, mulheres, LGBT, Quilombolas e etc.) possam contribuir na formação e participação ativa da 15º Conferência.
Eu, como pós-graduando e docente me senti contemplado com muitas falas, mas Fernando Cupertino e Ligia Bahia me fizeram refletir e entrar no debate quando pontuam que a conferência deve ampliar a participação do público, para que o brasileiro se aproprie do seu sistema de saúde, para que essas pessoas gerem expectativas e possam discutir as melhorias para o sistema. “Somos bons em fazer trabalho de prevenção, mas precisamos desenvolver um bom atendimento primário”, pontuou Cupertino.
É preciso ainda refletir sobre a importância das manifestações de Junho de 2013, que mudaram o cenário político do Brasil. “Temos pautas bem urgentes a serem discutidas, mas que, atualmente, estão ocultas como a pauta do aborto e a da privatização em saúde. Estamos falando de C&T sem empresários e de sistema de saúde sem médicos”, pontuou Lígia Bahia.
Neste momento acrescento que hoje temos um sistema de saúde muito mais multiprofissional, no qual não podemos debater C,T&I sem empresários e nem pesquisadores, assim como não podemos discutir ou rediscutir o sistema de saúde sem médicos, enfermeiros, farmacêuticos, dentistas, nutricionistas dentre outros profissionais.
A pesquisadora destacou ainda que “os pesquisadores só querem ir ao CNS quando a pesquisa está ameaçada”. Mais um ponto que concordo e que me abre a oportunidade de falar que os pesquisadores só buscam o CNS quando é de seu interesse e depois que o dito “problema” da pesquisa está resolvido eles retornam para suas cadeiras em seus laboratórios para focar nas publicações “Qualis A” e esquecem dos problemas da atenção básica e demais setores da saúde, que poderiam ricamente contribuir no debate.
Embora seja exigência das agências de fomento -CNPq, CAPES e FAP’s-, a publicação de artigos em revistas de alto impacto (Qualis A) e os pesquisadores sentem-se pressionados a cada vez mais aumentar sua demanda de publicações, destaco que é preciso que apresentemos a pesquisa como subsidio na formação política, é importante que haja valorização das revistas nacionais, pois a ciência é um direito de todos e para um pesquisador ser bom no seu trabalho ele não precisa pagar mais de 5 mil reais para publicar em uma revista européia, que nem todos os cientistas e/ou brasileiros tem acesso. É preciso que os pesquisadores pensem bastante na pesquisa em si, mas, antes de qualquer coisa, a mudança, a qualidade do ensino tem que ser fornecida na base. A graduação deve ser de qualidade para que tenhamos profissionais bem qualificados no mercado. Não adianta primar pela pós-graduação e esquecer a graduação. Deve haver um equilibro na formação do profissional de modo que o individuo esteja capacitado para o mercado de trabalho e para a carreira acadêmica, a depender de sua escolha de vida. É mais urgente ainda a inserção do debate político de saúde (nos cursos de saúde), a inserção desses alunos no dia a dia da saúde pública do nosso país e dos professores/pesquisadores no debate político da saúde. Para finalizar convoco os pesquisadores e alunos em saúde do nosso país para debater a política de saúde, participarem das pautas do CNS e na construção e participação ativa da 15ª Conferência Nacional de Saúde, a ser realizada no ano de 2015.
Que como discentes cobremos dos nossos mestres o debate político da saúde do país para que nos apropriemos do nosso sistema. E que enquanto docentes possamos formar nossos alunos para além dos muros da universidade e para além dos conhecimentos técnicos da profissão, que possamos formá-los para a vida. Esta é a verdadeira troca discente-docente.
Natal, 25 de Setembro de 2014
Lenilton S. da Silveira Júnior
Vice-Presidente Regional Nordeste da ANPG
Membro da Comissão Intersetorial de Ciência e Tecnologia do CNS
Professor de Citologia Clínica da UFRN