O 4º Salão Nacional de Divulgação Científica da ANPG, realizado entre os dias 12 e 17 de julho, na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), contou com vasta programação, que incluíram debates acerca do Financiamento da Ciência Brasileira, duas conferências, uma mostra científica e atos políticos contra os cortes orçamentários na Educação, Ciência, Tecnologia e Inovação, além de programação cultural diversificada e a comemoração dos 29 anos da entidade.
Com tão vasta programação, não poderia ser diferente que os ex-presidentes da Associação Nacional de Pós-Graduandos estivessem presentes nos debates, prestigiando o evento.
Luana Bonone, que foi nossa presidenta na gestão 2012-2014, foi uma delas. Em entrevista à nossa equipe, Luana comenta as lutas de sua gestão, a situação do Brasil e a luta dos pós-graduandos. Confira:
-Você é mestre ou doutora em qual programa e por qual universidade?
Mestra em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP.
– Quais foram as principais lutas empreendidas durante a sua gestão?
Como no congresso que nos elegeu foi anunciado o reajuste de bolsas conquistado na gestão anterior, nossas principais bandeiras passaram a ser por um mecanismo permanente de valorização das bolsas, garantia de inclusão dos pós-graduandos no PNAES (Plano Nacional de Assistência Estudantil) e universalização das bolsas de pesquisa para pós-graduandos. Debatemos bastante também os critérios de avaliação dos programas pela Capes, questionando o produtivismo exacerbado e valorizando os critérios de qualidade (reivindicando mais critérios qualitativos, inclusive). Outra pauta fundamental foi a recomposição do FNDCT (Fundo Nacional para o Desenvolvimento da Ciência e Tecnologia), desfalcado pela retirada dos recursos do petróleo deste fundo.
– Comente a situação do país durante sua gestão.
Vivenciamos o período em que o Brasil saiu do mapa da fome, conforme seria anunciado em setembro de 2014 pela ONU. Uso esse dado, anunciado após o final da gestão, para exemplificar de maneira contumaz a importância das políticas públicas de combate à desigualdade em curso naquele período. Entretanto, tais avanços conviveram com uma política econômica que, no sentido contrário, permaneceu alimentando a especulação do capital financeiro em lugar da produção, em que pese os debates sobre inovação terem ganhado vulto. O MCT virou MCTI em 2011 e isso trouxe impactos importantes na política do ministério, que viu na inovação uma espécie de tábua de salvação da indústria nacional (em contraste com a política de juros altos praticada). Entretanto, neste processo, por diversas vezes o investimento em ciência básica chegou a estar ameaçado e a lógica de financiamento buscava favorecer em especial as grandes corporações e instituições (havia uma tese sendo defendida, de que a FINEP deveria se converter em uma instituição financeira, um banco, por exemplo). Por outro lado, a pós-graduação brasileira cresceu no período, assim como os investimentos públicos em Educação e em C,T&I.
– Como você vê a ANPG antes e como enxerga agora?
Tive a oportunidade de conhecer a ANPG quando eu ainda estava na graduação, na UFMG, e cheguei a contribuir na organização de um congresso em Belo Horizonte, em 2006. Naquela época o congresso da ANPG não reunia muito mais que 100 pessoas. Lembro que discutia-se com muita urgência a inserção dos recém mestres e doutores no mercado de trabalho, pauta sem dúvida ainda bastante atual. Bom, desde então vi a ANPG crescer muito em termos de participação dos pós-graduandos nas suas atividades, em termos de visibilidade, de articulação junto a outras instituições e junto ao Poder Público, em termos mesmo de produção científica, por meio da revista e das mostras. Em 2009 foi criado o Salão Nacional de Divulgação Científica, que é um espaço muito rico de debate, troca, elaboração, divulgação e manifestações política e cultural. Penso que o poder de mobilização e influência da ANPG cresceu e tem potencial para crescer ainda mais. O que nunca mudou foi a certeza de que a ANPG, desde a sua fundação, cumpre um papel fundamental de organização e articulação dos pós-graduandos, dando espaço para atuação, debate e elaboração de pautas, contribuindo inclusive na formação cidadã e política de pessoas que tendem a ter espaços importantes de atuação na sociedade, seja em universidade, em instituições públicas, institutos de pesquisa ou atividades no setor privado.
– Na sua opinião , quais os principais avanços na luta dos pós-graduandos ao longo dos 29 anos da ANPG?
Bom, a política de vinculação das bolsas aos salários docentes chegou a ser implementada no ano de 1985 por proposição e mobilização da ANPG. Ainda que tenha caído poucos meses depois, esta conquista foi histórica e até hoje é referência na elaboração das pautas dos pós-graduandos. A ANPG também mobilizou pós-graduandos contra o fechamento da Capes durante o governo Collor, na década de 1990, outro marco importante. A partir dos anos 2000 a entidade passou a compor as comissões que elaboram os PNPG (Plano Nacional de Pós-Graduação), além de ter voz e voto no Conselho Técnico-Científico e no Conselho Superior da Capes, e mais recentemente conquistou assento também do Conselho Deliberativo do CNPq. Esta conquista de espaços quer dizer que a ANPG tem canais para influenciar a elaboração e implementação da política nacional de pós-graduação e pesquisa. Usamos esses canais, por exemplo, para garantir a publicação da Portaria que garante licença-maternidade às bolsistas Capes em 2011 (o CNPq já implementava tal política). Mas o marco da geração que eu participei foi na gestão em que a Elisangela Lizardo presidiu a ANPG, quando conseguimos realizar uma paralisação nacional de pós-graduandos, mobilizando APGs e grupos de pós-graduandos em todo o país pelo reajuste das bolsas de pesquisa (que completavam quatro anos sem qualquer reajuste). No mesmo período, fizemos uma campanha com um vídeo na internet chamada “#MinhaBolsaNãoAumentou” que viralizou. E o resultado foi que, mesmo não estando previsto no orçamento aprovado pelo Congresso Nacional, foi anunciado o reajuste de bolsas pelos presidentes da Capes e do CNPq no próprio congresso da ANPG em 2012.
– Comente a atual situação em que passa o Brasil e quais são os desafios que a ANPG precisará enfrentar nos próximos tempos na luta por mais direitos para os pós-graduandos?
Penso que o Brasil vive um momento de crise econômica e social. É um período bastante delicado, pois nos anos anteriores tivemos avanços importantíssimos em termos de mobilidade social, acesso a direitos (inclusive educação) e redução da pobreza. Entretanto, o ambiente internacional conturbado, marcado por uma política de guerras (Afeganistão, Iraque, Palestina, etc.) e de crise financeira com impactos.
Confira as entrevistas com outros ex-presidentes da ANPG:
Especial ex-presidentes no 4o Salão – Hugo Valadares
Especial ex-presidentes no 4o Salão: Elisangela Lizardo
Da Redação