CARTA DE FORTALEZA
EM DEFESA DA DEMOCRACIA, CONTRA ESTE AJUSTE FISCAL E POR MAIS DIREITOS!
Nos últimos 12 anos, floresceu no país um ciclo de crescimento econômico inclusivo, fortalecimento da soberania nacional e criação de oportunidades para o povo. Parcelas historicamente oprimidas da população, até então invisíveis aos olhos do Estado, passaram a ser foco de políticas sociais que lograram mudar sensivelmente a cara do Brasil. Saímos do mapa internacional da fome, instituímos uma política de valorização do salário mínimo, milhares de famílias viram materializado seu direito à moradia e ao atendimento de necessidades fundamentais como energia elétrica. E a universidade brasileira foi palco de uma das maiores transformações sociais de nossa história: os filhos e filhas dos trabalhadores, pela primeira vez, puderam ter acesso ao ensino superior.
Na pós-graduação, viu-se um ciclo virtuoso com a expansão das bolsas e ampliação das agências de fomento, possibilitando a ascensão brasileira no ranking internacional de países com maior produção científica. Dentre estudantes de pós-graduação, 28% são negros e negras, tingindo com as cores do povo também o ambiente universitário. Jovens, mulheres, negros e negras, indígenas, população LBGT, quilombolas, ribeirinhos, camponeses, foram visibilizados em políticas e ações afirmativas, como cotas sociais, para mulheres e étnico-raciais, cujo objetivo era construir a democracia real, para além da igualdade formal garantida a duras penas na Constituição de 1988.
Os avanços foram muitos, mas ainda não suficientes para as necessidades do país. Há ainda muito a ser feito no sentido de garantir mais direitos e recuperar o país dos estragos feitos pelo ciclo neoliberal da década de 1990. A recente tragédia envolvendo o rompimento da barragem em Mariana-MG — o maior crime ambiental da história do país —, expressa a face mais crua do neoliberalismo: a Vale do Rio Doce, outrora patrimônio nacional, foi rifada a baixo preço para atender aos interesses privados de lucro máximo em detrimento do meio ambiente e das vidas de milhares de pessoas.
Ainda assim, os setores conservadores brasileiros, que dominaram e espoliaram o país e nosso povo durante cinco séculos, não admitem perder nem mesmo um mísero quinhão de seus privilégios, e vêm atuando, cada vez mais, pela desestabilização política e econômica do país, cujo objetivo central é a interrupção do ciclo progressista e o retorno à austeridade neoliberal. O capital financeiro, parasitário, que, em 2008, arremessou o mundo na maior crise sistêmica do capitalismo desde 1929, atua fortemente no sentido de estrangular definitivamente o respiro democrático e popular que vivenciamos nos últimos anos no Brasil e na América Latina. Vivemos hoje uma crise internacional sem precedentes, na qual, em todo o mundo, o capital tenta jogar sobre as costas dos trabalhadores e trabalhadoras e dos povos a conta da crise que ele mesmo criou. Crise essa que só demonstra a exaustão do sistema capitalista: por todo o mundo recessão, desemprego massivo e agressões imperialistas a nações soberanas dão uma demonstração da crise civilizatória pela qual passamos. No entanto, os povos resistem!
Nesse pano de fundo, trava-se uma dura luta no Brasil, com dois projetos em confronto: a continuidade do ciclo progressista, rumo a mais avanços e mais direitos sociais, ou o retorno ao Estado mínimo, extermínio das políticas sociais e pautas ultrarreacionárias aos direitos civis e liberdades individuais, como a aprovação das MPs 664 e 665 que atacam o seguro desemprego, o projeto da terceirização, a redução da maioridade penal, e o PL 5069, que visa a dificultar o acesso das vítimas de violência sexual aos serviços de saúde e ao aborto legal. O Congresso Nacional, apontado como tendo a composição mais conservadora desde o golpe militar, vem agindo claramente com o intuito de impor duras derrotas ao povo e aos movimentos sociais, retrocedendo em direitos humanos, trabalhistas e previdenciários, assegurados constitucionalmente e que agora correm o sério risco de serem exterminados. A ala conservadora do Congresso, liderada pelo deputado ultrarreacionário Eduardo Cunha (PMDB/RJ), vem trabalhando diuturnamente pelo impeachment da presidenta Dilma. O bloco conservador e reacionário conta ainda com poderosos reforços do oligopólio da mídia corporativa e do Poder Judiciário no intuito de inviabilizar o campo democrático e popular no governo. Não aceitaremos o impeachment! Não ao golpe! Tampouco aceitaremos retrocessos, como a criminalização dos movimentos sociais e manifestações (como preconiza o Projeto de Lei Antiterrorismo) ou os cortes em investimentos em áreas estratégicas, como Educação e Ciência & Tecnologia.
Imprensada por um jogo de forças desfavorável, a presidenta Dilma Rousseff vem tentando recompor a unidade nacional em um país drasticamente polarizado, sobretudo desde as eleições de 2014. A política conciliadora dos primeiros anos do ciclo progressista mostrou ter chegado ao seu limite, sendo necessárioum novo pacto do projeto popular e das forças sociais e políticas que o apoiam. Entretanto, as alternativas apontadas para este impasse têm estado distantes de darem solução, ao contrário, o governo vem apostando em ajuste fiscal restritivo e pouco planejado e uma política macroeconômica contracionistasob execução do Ministério da Fazenda. Atentamos para a preocupação de que esse ciclo virtuoso que a pós-graduação viveu na última década encontra-se fortemente ameaçado na atual cena política. Primeiro, pela crise política que o país atravessa, que trouxe à tona o que há de mais conservador e reacionário no pensamento político, incluindo ameaças de golpe à nossa ainda jovem democracia. Segundo, pela crise financeira e pelas “soluções” de enfrentamento que o governo vem propondo a ela, que penaliza os direitos sociais e possibilidades de retomada efetiva do crescimento, além de prejudicar o caminho de inclusão social e oportunidades.Por tudo isso, é urgente que a presidenta Dilma substitua essa política recessiva na condução econômica.
Ressaltamos que as saídas para a superação da crise econômica não podem penalizar os direitos sociais conquistados com muita luta pelo povo brasileiro. Também não podemos permitir a interrupção do ciclo de crescimento ou ameaçar nossas possibilidades de futuro, com os cortes em orçamentos estratégicos para o desenvolvimento nacional autônomo e soberano. Ao contrário: a saída para reequilibrar o orçamento é o investimento em políticas voltadas para o crescimento. Mais Estado e menos mercado!
A garantia de mais direitos para o povo brasileiro passa pelo fortalecimento da economia nacional, retomada do crescimento e defesa da democracia, com os movimentos sociais e populares nas ruas! A “luta contra a corrupção” não pode ser instrumentalizada por aqueles que perderam nas urnas e querem através de um golpe institucional tomar ao poder.Defendemos a apuração de todos os crimes contra o erário e a punição dos culpados, mas não admitiremos que uma bandeira tão justa sirva de pretexto para o ataque à economia nacional e à nossa democracia!
Portanto,os pós-graduandos brasileiros exigem o respeito à soberania populare ao mandato constitucional da presidenta Dilma, ao passo em que reivindicamos que seu governo mude o curso dessa política econômica para que o Brasil volte a crescer, com distribuição de renda e inclusão social.Estaremos atentos e mobilizados em defesa da democracia; da Petrobras e da economia nacional; pela retomada do crescimento e ampliação do investimento em Ciência & Tecnologia e Educação, fundamentais para o desenvolvimento e soberania nacionais, pela manutenção e ampliação dos programas sociais e contra o ajuste fiscal que penaliza os trabalhadores e trabalhadoras!É preciso mudar: a começar pela imediata redução das taxas de juros, reversão dos cortes orçamentários e fim do superávit fiscal primário, pelo controle cambial e pela taxação das grandes fortunas. Em suma: outra política econômica, que garanta os direitos do povo!
Não admitimos nenhum retrocesso! Juntos, vamos construir o Brasil de nossos sonhos!
Fortaleza, 28 de novembro de 2015.
40° Conselho Nacional de Associações de Pós-Graduandos.
Leia aqui a Carta de Fortaleza em PDF.
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