Por Tamara Naiz,
Doutoranda, presidenta da ANPG
Há muito tempo que a relação entre público e privado no Brasil precisa de marcos fundacionais que assegurem transparência e melhorem as cooperações, para dar melhor seguimento às reformas e avanços que o Brasil precisa. Os pós-graduandos têm muito a dizer sobre isso e querem participar ativamente dessa discussão.
O marco legal da Ciência e Tecnologia, sancionado pela presidenta ontem (11), depois de tramitação pelo congresso nacional, tem grande importância nesse sentido, pois melhora a cooperação e dispõe de recursos para a ciência e tecnologia, sem minorar os centros de pesquisa das universidades. Ou seja, sem reduzir o papel do Estado. O Estado é e deve ser indutor da Ciência e Tecnologia. E é nesse sentido que somos contra qualquer tentativa de entregar recurso público para entidades privadas gastarem a seu rigor, classificando isso como investimento em ciência e tecnologia.
Um marco legal é importante porque esclarece, melhora e impõe regras para a relação público-privada. O Brasil que os brasileiros precisam deve ser construído por todos e para todos. A ciência deve estar a serviço da busca de soluções para os problemas de todos os brasileiros, desde as camadas médias até os brasileiros que estão nas periferias e nos rincões. A ciência precisa ter lado. E o lado da nossa ciência deve ser a busca da soberania nacional e do desenvolvimento do nosso povo. É por isso que a Associação Nacional de Pós-graduandos vem discutindo com sua base há algum tempo a importância da inovação e do financiamento da ciência no país. Nós, os pós-graduandos, somos responsáveis por mais de 90% das pesquisas em andamento no país e por essa razão temos muito a tratar sobre essa relação. Acreditamos que toda relação público-privada deve satisfazer, necessariamente, o interesse público. Um projeto financiado pelo Estado também pode e deve ter financiamento privado, contanto que o produto gerado seja para melhoria do povo brasileiro. Nesse sentido, as patentes devem ser melhor pensadas para não se tornarem objeto privado e mercadológico.
Por outro lado, ao tratar da ciência no Brasil não podemos deixar de lidar com a falta de recursos que a pesquisa brasileira vem atravessando já faz alguns anos. Mesmo antes do ajuste fiscal o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) tem sofrido com escassez de recursos. Embora tenha sido criado pelo Decreto-Lei da década de 60 e regulamentado pela Lei 11.540 de 2007, o FNDCT não prevê evolução orçamentária de crescimento do fundo. Queremos ensejar essa discussão na sociedade brasileira, levando em conta o papel protagonista que a ciência precisa desempenhar nos próximos anos. Portanto, sem dinheiro e aplicação justa e equânime será difícil fazer ciência de qualidade. Sem recursos, o marco legal sancionado hoje pode se tornar uma espécie de Protocolo de Kyoto da ciência brasileira. Como não queremos que um marco legal como esse tenha o mesmo destino dos fundos setoriais que foram agregados ao FNDCT, expressamos a vontade que o ajuste fiscal não corte recursos de setores estratégicos como a ciência, tecnologia e inovação.
É pensando no futuro que se faz ciência, e é de investimento e pesquisadores valorizados que uma ciência de qualidade precisa.
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