Por Iberê Marti*
Na última década, dobrou se o número de matriculas na pós-graduação brasileira, por ano. Mesmo assim, apenas 0,5 % da população brasileira tem titulo de mestre e doutor. Enquanto no Brasil temos 1,4 doutor para cada um mil habitante, na Alemanha e no EUA, tem 15,4 e 8,4 doutores para cada mil habitantes, respectivamente. Ou seja, este crescimento é essencial, se queremos desenvolver Tecnologias Socioambientais e Inovação. Mas ainda incipiente.
Apesar desta expansão, é preciso perguntar se conseguimos enfrentar as nossas desigualdades históricas? Como exemplo, quantas mulheres na pós-graduação? Quantos negros? Quantos indígenas, quilombolas, ribeirinhos, caiçaras e moradores de periferias? Resolvemos as nossas desigualdades sociais, econômicas e geopolíticas (regionais)? E quanto à qualidade oferecida as nossas pós-graduandas e os nossos pós-graduandos? Estes estudantes/pesquisadores enfrentam diversas dificuldades, como exemplo, o número de bolsa de estudos é menor que a demanda, além da desvalorização das mesmas [bolsas]; a falta de uma política permanente de assistência estudantil; poucos recursos para desenvolver a pesquisa e extensão; entre outros. Outra dificuldade é a necessidade de assegurar os direitos básicos, a dignidade humana, como exemplo férias, licença maternidade, décimo terceiro, auxilio salubridade, entre outros. Além de sofrerem constrangimentos e agressões de ordem psicológica, como o assédio moral e/ou sexual.
Estas condições, acima expostas, criam o ambiente propício para que as pós-graduandas e pós-graduandos, organizados através de suas entidades representativas, ANPG e APG´s, construírem uma pauta nacional, na luta por uma lei que regulamente os nossos direitos, a Lei de Direitos dos Pós-Graduandos. Entretanto, qual é a ciência que queremos para o Brasil? Qual é a pós-graduação queremos para o Brasil? Qual é a tecnologia e a inovação? Qual é o Brasil que queremos? Estas questões colocam desafio urgente e pujante: Uma Pós-Graduação Nova! Mas como?
A história de formação cultural do povo brasileiro é autoritária (coronelista!), e, portanto, cheia de resquícios deste autoritarismo, e suas consequências e desdobramentos: violência física e psíquica: medo, repressão, perseguição, repressão, coação, etc., são alguns exemplos. Como disse Joaquim Nambuco, no final do Século XIX, “A escravidão ‘termina’ hoje. No entanto, as suas marcas, não”. O Brasil Novo necessita romper com estas estruturas e vícios. Isso significa que se queremos lutar por Uma Pós Graduação Nova, precisamos enfrentar discutir, debater e superar o nosso Passado. Uma lei que estabeleça e garanta os direitos aos pós-graduandos é fundamental, mas somente ela [lei] será suficiente para os nossos desafios, devaneios e sonhos?
Desta forma é preciso inovar. Inovar em nossas organizações e instituições, em nossas relações interpessoais. Ambientes inovadores devem ser livres de hierarquias, autoritarismos e preconceitos. Em diversos países com destaque em CT&I a ausência de hierarquia e o incentivo a participar e construir projetos é fundamental ao desenvolvimento intelectual, critico e cidadã das pós-graduandas e pós-graduandos.
Neste contexto, temos que buscar exemplos e experiências em outros contextos, e assim construir o nosso projeto de desenvolvimento nacional – de acordo com nossas características históricas. Conversando com amigas e amigos, que tiveram oportunidade de estudar em diversos países, foi possível enumerar algumas alternativas. Como exemplo, em diversos programas de pós-graduação em outros países, a relação aluno/professor, aluno/aluno, aluno/técnicos, alunos/comunidade/sociedade é muito mais próxima, dinâmica e igualitária.
A universidade deve experimentar formas de organizações que supere o nosso individualismo e egoísmo. É preciso incentivar a cooperação, a troca de conhecimentos e a solidariedade. (Nós cuidamos muito pouco uns dos outros e do que é coletivo comum). Proporcionando espaços de natureza horizontal e interdisciplinar, que fomentem as interseções coletivas e a cooperação, fundamental para a construção de um processo de desenvolvimento tecnológico e de inovação duradouro. Assim como organização econômica, que garanta o financiamento de pesquisas a médio e longo prazo.
A Pós-Graduação Nova no Brasil depende de mudança cultural que consiga experimentar novas formas de organização políticas, sociais e econômicas. As discussões que são realizadas para implementar a Lei de Direitos são fundamentais, que seja a base do que não queremos – continuar a reproduzir. E que sirvam para reflexão maior, que seja espaço para edificar e consolidar a ciência que queremos para o nosso povo.
A força motriz para continuar na luta por um país menos desigual e injusto, por um Brasil Novo, popular e melhor!
*Iberê Marti é diretor da ANPG e doutorando em Agronomia/Plantas Medicinais, Arom.e Condim. na UFLA.
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