O segundo dia do seminário debateu as relações entre a pós-graduação e o desenvolvimento nacional através do mercado de trabalho. A mesa “O mundo do trabalho no Brasil do século XXI” teve como debatedores os professores Antônio Carlos Mazzeo, da USP, Marilena Teixeira, da Unicamp, Elisângela Lizardo, assessora do Ministério de Ciência e Tecnologia, e Carlos Rogério Nunes, dirigente sindical da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB).
O professor Antônio Carlos Mazzeo fez um resgate histórico da formação social do país e a relacionou com os dilemas do trabalho nos tempos atuais. “O núcleo fundante da sociedade brasileira é o trabalho escravo. A escravidão moldou a sociedade. Com a abolição e a vinda dos trabalhadores europeus, criam-se diversas formas de trabalho, mas fundamentalmente moldadas pela escravidão”, afirmou.
Mazzeo disse ainda que essa herança escravista impacta na formação de consciências, gerando uma sociedade marcada por preconceitos e opressões. “O racismo permeia as relações do trabalho e as sociais. A escravidão gera uma ideologia supremacista e um caldo de cultura de uma sociedade autocrática. Uma burguesia sem projeto nacional e que vive da hiper exploração do trabalho”, finalizou.
Professora do Instituto de Economia da Unicamp, Marilena Teixeira abordou problemas estruturais na organização da sociedade capitalista que impossibilitam até mesmo haver trabalho para todos, criando um contingente de excluídos do processo produtivo. “Na atual fase do capitalismo, existe uma sociedade cindida entre quem tem acesso ao trabalho e quem não terá. E isso é inadmissível! O Estado tem que ser capaz de gerar emprego em setores estratégicos. Se o Estado intervém para socorrer bancos em momentos de crise, por que não pode socorrer o trabalho?”, indagou.
Marilena diz que uma parcela dos pós-graduandos está nesse contingente, não por falta de formação, mas por falta de perspectivas na atual realidade econômica do Brasil, só lhes restando empregabilidade na carreira acadêmica. “Parte do contingente de desempregados não são pessoas com baixa escolaridade, são os mestres e doutores que estão fora do mercado. Parte dos pesquisadores que não terminam mestrado e doutorado abandonam porque não veem perspectiva de trabalho fora da universidade”, disse.
O dirigente sindical Carlos Rogério Nunes apontou mudanças estruturais na organização do trabalho que romperam com paradigmas anteriores, como o fordismo, em que a linha de produção se completava no mesmo local. Ele relacionou a nova realidade ao desemprego estrutural e a dificuldades de organizar a luta por direitos. “Hoje em dia, a mais valia relativa, que são os aperfeiçoamentos da produção através da pesquisa, da evolução técnica, e também da organização e da gestão do trabalho, criou a produção flexível, espalhada, inclusive em países diferentes, desde que o custo do trabalho seja cada vez mais baixo. Por isso, há desemprego estrutural e muita informalidade”.
Para Elisângela Lizardo, assessora de Participação Social e Diversidade do Ministério de Ciência e Tecnologia, a situação híbrida do pós-graduando o coloca em uma posição pré-profissional, ou seja, que reivindica a condição de ingressar no mercado de trabalho, ainda que seja um produtor de pesquisa. “Estamos no banco de reservas. Queremos entrar em campo para disputar o jogo”, brincou.
Ela demonstrou que o Brasil vive uma evolução histórica na proporção de seus mestres e doutores. Entre 2005 e 2017, o país avançou de 17 para 30 mestres para cada 100 mil habitantes e de 5 para 10 doutores para a mesma proporção. “As mulheres são a maioria das tituladas, 55% no mestrado e 54% no doutorado. Entretanto, essa proporção vai diminuindo e se alterando na progressão da carreira, o que retrata a divisão sexual do trabalho”, afirmou criticando o machismo estrutural existente também na academia.
Elisângela apresentou dados de uma pesquisa realizada pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU) que mostram a carreira acadêmica como a principal motivação para fazer pesquisa para 42% dos mestrandos e doutorandos na instituição.
Retratando as dificuldades vividas pelos pós-graduandos, 59,1% já pensaram em abandonar o curso, sendo 24% pela carga de exigência do trabalho acadêmico, 21,7% por dificuldades em conciliar trabalho e pesquisa, 19,3% por questões de saúde mental e 17,9% por problemas financeiros.